sábado, 12 de julho de 2008

Do pragmatismo stalinista à porra-louquice trotskista

Reinaldo Azevedo: Pois é... Enquanto José Dirceu dava as cartas no, chamemos assim, “Sistema”, ele tinha certo método. Sabem como é... O homem nunca foi um teórico do stalinismo, mas sempre foi um stalinista empírico. Ele foi montando o sistema de informações e ocupação das instâncias do estado, em parceria com a máquina sindical, e lhe emprestava certa racionalidade.

Com a chegada de Márcio Thomas Bastos à Polícia Federal, parte da imprensa, a larga maioria, movida por admiração basbaque pelo “jurista da democracia”, permitiu, e até estimulou, que a Polícia Federal fosse convertida numa espécie de força de assalto. Volto àquele que é, para mim, o marco inicial dessa pantomima: a humilhação, desnecessária, excessiva, brucutu, a que foi submetida a empresária Eliana Tranchesi. Não estavam em busca de punir alguém acusado de sonegação. A intenção era clara; era a versão truculenta da novela mexicana: “os ricos também choram”. Há quem acredite nas virtudes purgadoras do ressentimento. Eu não acredito.


O “Sistema”, desde sempre uma máquina de intimidar adversários, mesmo quando o PT estava fora do poder — seus esbirros sempre estiveram em órgãos do estado colhendo informações sigilosas contra adversários —, acabou mudando de mãos. Saiu do controle centralizado de Dirceu, e fatias foram parar nas mãos de Tarso Genro: do stalinismo pragmático para o trotskismo irresponsável. Outro ex-trotskista da turma é a personagem oculta nessa história toda: Luiz Gushiken. Este, aliás, vinha perdendo todas as paradas — e a última delas foi a compra da Brasil Telecom pela Oi.

A operação que vimos — que, creio, abrirá rombos no próprio “Sistema”, já desarticulado — é fruto de modelo repressivo trapalhão, que vai se desfazendo por causa das guerras comerciais. Mas que pode causar estragos na vida de gente inocente. Tem de ser contido.
Anotem: isso nada tem a ver com moralização. Isso é só a expressão mais acabada de uma imoralidade.

Maranhão em Retrospectiva e em Perspectiva: Segunda Parte

Reproduzo abaixo artigo do Professor José Lemos:

Maranhão em Retrospectiva e em Perspectiva: Segunda Parte

É inquestionável o potencial que tem o Maranhão para ser um dos grandes produtores de matérias primas de origem vegetal ou animal e de alimentos no Brasil. Neste momento em que a crise de abastecimento de alimentos e a escassez relativa e especulativa de petróleo, cujo preço já chegou à cifra dos US$140,00 por barril, com projeções nada otimistas que admitem que logo chegará aos duzentos dólares, a busca de fontes renováveis a partir da bioenergia se manifesta como fato real e definitivo.

Assim, locais onde há potencialidades de produção desses itens, podem se tornar verdadeiros celeiros. O Maranhão já poderia ter assumido esta posição de liderança, não fora a utilização de políticas públicas equivocadas num passado não muito remoto. Com efeito, segundo o Censo Agropecuário de 2007, dos quase 15 milhões de hectares de terras disponíveis no Estado, apenas quatro milhões estão ocupados com lavouras permanentes e temporárias. Segundo este mesmo documento 4,6 milhões de hectares se constituem em áreas com matas e florestas.

Outros seis milhões de hectares estão ocupados com pastagens. Apenas trabalhando sobre as atuais áreas com lavouras e pastagens, sem derrubar uma única árvore das matas e florestas, o Maranhão pode deslanchar uma revolução agrícola e agrária, bastando utilizar tecnologias adaptadas e adequadas para aproximadamente um milhão da sua população que sobrevive diretamente dessas atividades. Já demonstramos, em texto anterior, que se as produtividades da terra no Maranhão nos cultivos de arroz, feijão, mandioca e milho se aproximarem daquelas observadas nos principais estados produtores, e se cultivássemos áreas com essas culturas como fazíamos em 1982 (pouco mais de dois milhões de hectares), o Maranhão poderia ser um grande centro de referência.

A outra metade da área atualmente ocupada com lavouras permanentes e temporárias poderia ser destinada à produção de fruteiras utilizando irrigação, e para a produção de bioenergia, utilizando técnicas de rotação de cultura. Para isso acontecer deve haver sinergia entre o Estado e a iniciativa privada. O Estado criando condições para os agricultores familiares acessarem aos programas do Governo Federal como o PRONAF e fazendo a sua parte provendo, para esses agricultores, Assistência Técnica, Extensão, Fomento e Pesquisa. Mas também criando atrativos de políticas fiscais, incrementando infra-estrutura logística para os grandes empreendedores, mas cobrando de todos, (agricultores familiares e grandes empresários), a necessária parcimônia na utilização dos recursos naturais, deixando todos restritos às áreas atualmente ocupadas com pastagens e lavouras, sem avançarem nas áreas de florestas. Isto seria conseguido mediante o zoneamento agroecológico do Estado em escala de um para cem mil.

Mas para que o desenvolvimento possa acontecer, o Estado também precisa avançar em indicadores de educação, num ritmo tão ou mais acelerado que aquele que ocorreu no período 2001 / 2006. Naquele período observou-se um salto quantitativo razoável na escolaridade média do Estado, que saiu de 4,5 anos em 2001 para 5,8 anos em 2006. Com base em evidencias mostradas no meu livro e em estatísticas recentes do IBGE, estima-se que este foi um processo que se espraiou por todos os 217 municípios maranhenses, de tal sorte que em 30 deles a escolaridade média já superava seis anos ao final de 2006. Em 93 municípios maranhenses a escolaridade média superava os cinco anos. Mas ainda há um lado sombrio em que 35 municípios liderados por Belágua, São João do Caru e Fernando Falcão, possuem escolaridade menor do que quatro anos. Além disso, em mais da metade (123 municípios) ainda prevalece escolaridade média inferior a cinco anos. Ao ritmo de aceleração atual projeta-se para 2010 que 146 municípios maranhenses terão escolaridade média superior a seis anos, e em 20 deles a escolaridade superará sete anos, aproximando-se da média atual no Brasil (7,4 anos).

Deve haver um trabalho de provisão de acesso aos serviços essenciais como água encanada e saneamento. Com efeito, em 120 municípios maranhenses metade da população ainda sobrevive em domicílios sem acesso a água encanada. Em 184 deles, metade da população sobrevive em domicílios sem acesso a destino adequado para os dejetos humanos. Estima-se que o IDH do Maranhão saltou para 0,705 em 2006. Em torno desta média gravitam valores que variam entre 0,601 e 0,729. O Índice de Exclusão Social varia de 20,84% a 61,05%, oscilando em torno de uma média de 39% para o Estado. Valores ainda elevados e que precisam ser revertidos com urgência. Assim, melhorar estes indicadores sociais, incrementar a escolaridade, reduzir as taxas de analfabetismo e prover serviços de assistência técnica, extensão, fomento, pesquisa e infraestrutura logistica para melhorar a renda rural, se constituem, na nossa avaliação, na agenda mínima a ser construída para ancorar e promover um ciclo virtuoso de desenvolvimento no Estado na virada desta primeira década do primeiro milênio.

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José Lemos é Engenheiro Agrônomo e Professor Associado na Universidade Federal do Ceará. lemos@ufc.br. Autor do Livro “Mapa da Exclusão Social no Brasil: Radiografia de Um País Assimetricamente Pobre”.

terça-feira, 8 de julho de 2008

O etanol e a solidão das vaquinhas brasileiras

Folha: (Rogério Cezar de Cerqueira Leite) As críticas que se erigiram nos últimos cinco ou seis meses ao álcool combustível de cana-de-açúcar, a mais renitente é aquela que se refere à competição com a produção de alimentos. No que segue, vamos demonstrar que há muita ignorância e uma certa dose de má-fé no alicerce desses argumentos. Afirmam os especialistas que a população do globo deverá estacionar entre 9 bilhões e 10 bilhões de habitantes. Como todo mundo sabe, a máquina biológica humana consome em média 2.000 kcal por dia. Isso corresponde a aproximadamente 600 gramas de cereal por dia, o que, para um vegetariano, é suficiente.

O Homo sapiens, porém, pode usar o dobro: para cada quilo de carne, consome entre 7 kg (gado confinado) e 2 kg (frango de granja) de cereal. Supondo um consumo individual de 40 kg a 60 kg de carne por ano (frutos do mar etc. vão de lambujem), podemos deduzir que mais 600 gramas de cereal serão necessários por dia.

Com isso, a humanidade, para viver saudavelmente, deverá consumir anualmente, direta e indiretamente, entre 4 bilhões e 5 bilhões de toneladas por ano de cereais, o que demandaria uma área de cerca de 800 milhões de hectares com tecnologias atuais (produtividades entre 10 toneladas/ha por ano, que é o caso do milho, e 4 toneladas/ha por ano -arroz, trigo, soja- são correntes).

Para substituir todo o combustível fóssil consumido hoje por etanol, incluídas tecnologias que aproveitassem integralmente os resíduos lignocelulósicos da produção de álcool e cereais, seriam necessários entre 300 milhões e 400 milhões de hectares. Ora, a FAO informa que o total de terras cultivadas é de 1,5 bilhão de hectares, havendo ainda uma disponibilidade adicional de terras cultiváveis de 3,5 bilhões de hectares.

Ou seja, não será preciso ampliar a área cultivada para suprir a humanidade de toda a comida e energia de que precisa hoje e precisará no futuro, mesmo que o consumo de energia dobre e a população do globo atinja o limite superior. Bastaria usar tecnologias atuais que aumentam a produtividade. E ainda há terra disponível, aquela atualmente não cultivada, para uma população extra de 30 Chinas ou 4,5 vezes a população final da humanidade. Ainda bem que os chineses ainda não perceberam essa abundância de terras cultiváveis.

Outra fantasia criada pela mente mórbida dos ecoidiotas transnacionais e ecoada por nossos verdolengos com e sem colete propõe uma espécie de mecanismo dominó. Assim, a expansão da cultura da cana-de-açúcar estaria impelindo a soja para o norte, que, por sua vez, estaria empurrando o gado, que, como conseqüência, estaria invadindo a floresta amazônica. Ora, a invasão da Amazônia pela soja e por pastagens ocorreu antes de qualquer aumento de produção de cana. Vamos, todavia, ver por que esse ecobesteirol, além de ser pura fantasia inconsistente, é fruto de má-fé.

A cultura da cana ocupa cerca de 6,5 milhões de hectares (aproximadamente metade para o álcool, metade para o açúcar), a soja ocupa 22 milhões, e as pastagens, 200 milhões. Dobrando a produção do álcool e mantidas as mesmas deficiências tecnológicas atuais, seriam ocupados menos que 2% da área de pastagens. Nosso rebanho tem cerca de 200 milhões de cabeças (uma vaca por hectare). Ou seja, a distância média intervacas, que é de 100 metros, seria reduzida para 98 metros. Seria um transtorno muito grande para as pobres vaquinhas ou, ao contrário, contribuiria para a redução da solidão em que se encontram essas senhoras?

Como não é possível acreditar que os ecofestivos brasileiros sejam incapazes de uma aritmética tão elementar como a aqui utilizada, só nos resta crer que não se vexam de utilizar argumentos pífios e de má-fé. Ai, que saudades da Marina! Então, como se explica a onda neomalthusiana que abala os alicerces das políticas de biocombustíveis, inclusive a do álcool de cana-de-açúcar? Há certamente várias vertentes.

Em primeiro lugar, um inequívoco jogo de interesses comezinhos de nações, empresas e políticos. Em segundo, uma imensa e indesculpável ignorância de fatos corriqueiros e de aritmética elementar. E o que há de mais extraordinário é que essa militância pseudoconservacionista se põe a serviço de inconfessáveis interesses de empresas de petróleo e especuladores no setor de alimentos.

ROGÉRIO CEZAR DE CERQUEIRA LEITE , 76, físico, é professor emérito da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) e membro do Conselho Editorial da Folha .

Deprimente

O senador José Sarney, ex-deputado, ex-governador, ex-presidente da República, membro da Academia Brasileira de Letras, um homem que conseguiu muito mais na política do que poderia alcançar por seus méritos, a olhos de muitos, deve parecer um homem feliz e completamente realizado. Teve muito mais do que poderia sonhar e gente assim geralmente se torna um conselheiro e uma pessoa especial que pensa em gastar os anos que lhe restam ajudando, aconselhando e dando exemplos. Mas não é assim que ele demonstra sentir.

Juscelino Kubitschek, por seus méritos, ganhou tudo o que quis na política. Foi um presidente amado por todos os brasileiros por tudo que proporcionou ao país e ao seu povo. O Brasil de Juscelino era uma euforia só. Chutamos para longe o famoso “complexo de vira-latas” que o grande Nelson Rodrigues enxergava em nós. De repente, em 1958 nos tornamos campeões mundiais de tudo. Futebol, boxe, tênis, basquete etc. Criamos a bossa-nova, que mudou e deu charme ao país, o Rio de Janeiro era uma maravilha incomparável, um verdadeiro paraíso. O brasileiro se tornou orgulhoso de seu país e éramos admirados pelo mundo inteiro. Era a época de Marta Rocha e, puxando tudo, estava o presidente bossa-nova, Juscelino.

Por isso ele sofreu tanto pelas perseguições que passou a ser impingido. Tenho a impressão que ele não entendia direito o que se passava consigo. Ele, que a tudo perdoava, e que tinha uma imensa compreensão das dificuldades do povo brasileiro, que lhe amava, não suportou o exílio e os inquéritos que lhes foram impostos e acabou por se tornar um homem triste antes de morrer tragicamente em acidente de carro. Mas sempre amado pelo povo brasileiro que não o esquece até hoje.

Uma tarde, eu exercia a superintendência da Novacap, Companhia Urbanizadora da Nova Capital, em Brasília, e recebi a visita do grande arquiteto Oscar Niemeyer. Não era uma visita de trabalho, como foram tantas outras. Ele vinha pedir por Juscelino. A anistia havia sido decretada e restava ainda um processo aberto, que não havia sido concluído, na justiça. Era uma ação movida anos atrás pela Novacap contra o ex-presidente. Ele era acusado de ter usado funcionários da companhia para pintar e reformar o seu apartamento na Avenida Atlântica, Copacabana, Rio de Janeiro. Era um processo considerado por todos um verdadeiro absurdo e Oscar Niemeyer vinha pedir o seu arquivamento, para que Juscelino pudesse voltar em paz ao Brasil. Chamei o saudoso Dr. Dario, Consultor Jurídico da Companhia e dentro de pouco minutos decidimos retirar a ação, nunca concluída e permitindo assim a volta do grande presidente ao Brasil.

Dois homens que, de maneira diversa, chegaram ao topo da política: Juscelino e Sarney. Juscelino, amado sempre, nunca perseguiu ninguém e sempre usou a sua influência para unir o país e lutar pela conciliação e pelo desenvolvimento. Nunca usou o imenso poder que teve em suas mãos para perseguir adversários, nem em Minas nem no país. Sarney, ao contrário, se tornou muito mais poderoso à sombra da popularidade do presidente Lula do que quando exerceu a presidência. E usou toda a força que lhe caiu nas mãos para impedir que o Maranhão recebesse grandes projetos públicos ou privados de dimensões capazes de desenvolver o estado. Além disso, chefiou uma oligarquia durante 40 anos que atrasou o estado e empobreceu sua população.

Mas, principalmente nos últimos anos, se notabilizou pela perseguição sem tréguas aos seus adversários políticos, novos ou velhos, da maneira mais torpe, disposto a arrasar com todos os que ousam ter outra opinião ou contrariar os interesses da família.

Agora se notabiliza por perseguir jornais e jornalistas. Uma ironia para quem se dizia orgulhoso de portar carteira de jornalista. Uma dupla ironia para quem é dono do maior complexo jornalístico do estado. Não consegue mais defender a sua trajetória política com os próprios meios de mídia que dispõe simplesmente, pois os fatos se impõem, e Bandeira Tribuzzi, grande intelectual e mentor do pensamento e dos propósitos dos primeiros anos da trajetória de Sarney e do seu grupo, que com sua morte, se tornou muito diferente, dizia que “não adiantava lutar contra os fatos”. Só insultar já não lhe basta. Passou a perseguir jornalistas por meio de processos em que exige indenizações milionárias ou mais recentemente processos penais. Quer que eles sejam algemados e presos. Única forma de se sentir contente.

Já são 9 jornalistas no Amapá e aqui a perseguição é total sobre o Jornal Pequeno e sobre Lourival Bogéa. Quer R$ 200 mil, a prisão de Lourival e mais a falência do Jornal. É o mundo ideal de Sarney. Sem contraditório, só ele mandando insultar todo mundo. E quem viu o processo diz que é embasado em matérias transcritas da Veja, Estado de São Paulo e outros. Porque então não processar a Veja? Medo de mostrar ao Brasil quem ele é realmente?

Deve ser muito triste para alguém que foi o que ele foi, viver seus anos de vida avançada amargurado, só pensando em fazer o mal a quem ele considera adversário. É uma tragédia pessoal. Que vida, em que tenta se imortalizar na marra, tomando, por meio de chicanas jurídicas, um prédio público, tombado, o Convento das Mercês, onde pensa ter sua última morada. Nos seus devaneios, o povo vai em romaria visitar o seu túmulo conforme disse a revista “Carta Capital”. Muito triste.