
Memória
No dia 9 de abril de 2007, há mais de um ano, escrevi aqui um post intitulado O Povo é de direita, revela o Datafolha. Foi uma gritaria danada. O link com a íntegra está aí. Recupero dois trechos:
" (...) um político que tivesse rigorosamente as opiniões do povo brasileiro (...) seria chamado de 'direitista' pela esquerda, certo? Quem sabe até de reacionário... E isso estaria a indicar que o povo brasileiro é, então, majoritariamente, 'de direita'. Ora, se ele é de direita, por que, então, estamos sendo governados pela esquerda — ainda que essa 'esquerda' seja a petista, com seu fanatismo recém-adquirido pelo financismo? A resposta é simples: questões como as colocadas acima [aborto, pena de morte, drogas] simplesmente estiveram ausentes do debate eleitoral. E os politicólogos brasileiros, quase todos de esquerda, acham que isso é um sinal do nosso amadurecimento. Essas clivagens aparecem nos confrontos eleitorais dos EUA e da Europa — sabem?, eles são os bárbaros... Já os civilizados brasileiros preferem não entrar nesse mérito porque acham que esse é um debate grosseiro."
"DEM e PSDB cometem, a meu ver, dois erros crassos: não conseguem ter um discurso organizado sobre economia para confrontar o PT e renunciam a fazer o que chamo de guerra de valores com a esquerda. O Datafolha esfrega no nariz das duas legendas o óbvio: o povo brasileiro é conservador e, vejam só, não tem, no Parlamento, quem o represente a contento."
Antes ainda, no dia 13 de agosto de 2006, escrevi aqui: "Uma boa leva de políticos no Brasil deveria olhar para os dados do Datafolha com vergonha. Vergonha de si mesmos e de sua covardia. Existe uma maioria silenciosa que hoje não encontra uma representação consistente. Uma boa pergunta seria a seguinte: como pode Lula vencer, ao menos por enquanto, a disputa presidencial no 1º turno se a maioria da população é mesmo de direita?". Nas duas datas, havia pesquisas Datafolha investigando a opinião dos brasileiros sobre questões de comportamento. Vamos, então, ao levantamento de agora.
A nova pesquisa
Sim, senhores: dados os perfis ideológicos que se desenham a partir de certas opiniões, pode-se dizer que a maioria dos jovens brasileiros é de direita. Declaram ter essa posição ideológica, aliás, 37% dos entrevistados (na população como um todo, são 35%). Dizem-se de esquerda apenas 28% (contra 22% do total). No centro, estão 23% (contra 17% no conjunto). Mas notem: não quero me apegar a nominalismos. Parto do princípio de que os jovens possam não ter a exata noção do que tais nomes encerram. Assim, parece-me, é conveniente informar opiniões muito específicas.
Aborto
O ministro José Gomes Temporão e os nossos "pogreçistas" certamente ficam desgostosos, mas o fato é que 68% dos entrevistados não querem mudar a lei do aborto — pretendem que a prática continue a ser considerada um crime, com duas exceções: gravidez decorrente de estupro e risco de morte da mãe. É o mesmo índice do conjunto da população.
Pena de morte
No que respeita à pena de morte, os jovens se mostraram ainda mais severos do que o povo como um todo: 50% se disseram favoráveis (contra 47% no outro grupo). Dizem-se contrários 46% nos dois universos.
Maconha
Acham que deve ser proibido fumar maconha nada menos de 72% dos entrevistados (ligeiramente inferior aos 76% de todos os brasileiros). Apenas 25% acreditam que deve "deixar de ser crime" (contra 20% no outro grupo). Aqui: só uma lembrança ao caderno da Folha: fumar maconha já não pode mais ser considerado um "crime" — traficar é que é. Como se vê, "Uzome da lei" no Brasil são mais laxistas do que os jovens...
Maioridade penal
No caso da maioridade penal, defendem a atual legislação apenas 12% dos ouvidos — 13% no total. Para 83%, a idade deve baixar: 37% acham que pode ser inferior a 16, e 46% a partir dessa idade.
Deus
E Deus, hein? Deus está morto? Parece que não! Apenas 1% dos jovens se dizem ateus, e 10% dizem não ter religião: 59% são católicos; 16%, evangélicos pentecostais, e 8%, evangélicos não-pentescostais. As demais religiões: espírita (2%), judaica (1%), umbanda (1%), candomblé (1%), outras (2%).
Valores
E quais são os valores das moças e moços? Qual é a lista das coisas que acham "muito importantes"? Vejam: família (99%), saúde (99%), trabalho (97%), estudo (96%), lazer (88%), amigos (85%), religião (81%), sexo (81%), dinheiro (79%), beleza (74%), casamento (72%).
E então...
E, vejam que surpresa, o levantamento mostra que os nossos jovens querem casa, carro, grana, todas essas malditas coisas do "consumismo", que deixam os comunistas que já têm todas essas malditas coisas muito decepcionados com a juventude...
Mais uma vez, constata-se o óbvio: há um enorme hiato entre o que pensa o conjunto da população — e, nela, sua fatia mais pretensamente inquieta — e os vários canais que vocalizam a opinião pública. Não, senhores! Não temos a imprensa que representa os valores que vão acima: a nossa, com as exceções de praxe, é majoritariamente "politicamente correta" e experimenta um verdadeiro divórcio em relação ao pensamento da maioria.