Dentre os muitos assuntos que formam a pauta do acordo
assinado entre os presidentes do Brasil e da China na semana passada sobressai
um projeto ferroviário que não interessa ao Maranhão. Trata-se de uma ligação
da Ferrovia Norte-Sul em Campinorte (GO) até um porto no litoral peruano às
margens do Oceano Pacífico.
Essa ligação é cara e dificílima de executar, pois atravessa
pântanos, áreas indígenas, florestas e a Cordilheira dos Andes. Ademais, não há
estudos aprofundados, nem projetos de engenharia e tampouco estudos de
viabilidade. Dessa forma, essa empreitada terá pela frente problemas ambientais
e de engenharia e só há uma certeza: será caríssima, com custo estimado em
torno de dez bilhões de dólares, ou seja, entre trinta a quarenta bilhões de
reais. E isso é apenas um uma estimativa, pois sem projeto de engenharia e sem
estudo de viabilidade econômica é impossível ter certeza do quanto realmente custará.
Sem esses itens é praticamente impossível levar a sério tal projeto e vejam que
só o custo para elaboração desses estudos girará em torno de um bilhão de
reais.
Agora me digam: esse projeto é afinal importante para o
Brasil? Valeria à pena o país se endividar ou reprogramar recursos de outros
projetos muito mais importantes, a fim de ficarmos só na logística, e para nos
metermos na aventura chinesa? De jeito nenhum!
Muito melhor seria fazer a ligação já aprovada pelo TCU de Lucas do Rio
Verde, em Mato Grosso, coração do centro produtor de grãos do Centro-Oeste, com
Campinorte (GO), na Ferrovia Norte-Sul e daí com a Ferrovia dos Carajás e,
consequentemente, com o Porto do Itaqui e o Termial de Grãos - TEGRAM, tudo já
pronto e funcionando. Dessa forma, pelo Porto do Itaqui via Canal do Panamá, em
obras de ampliação, chegar até os portos chineses com o menor custo possível.
Só se explica o anúncio desse projeto pela completa
desorientação do governo, que parece totalmente perdido e no afã de tentar dar
boas notícias. Acaba parecendo mais um factoide, aliás, com factoides já temos
amargas experiências, pois temos um aqui no Maranhão - a badalada Refinaria
Premium - também lançada por um presidente do Brasil, uma triste lembrança.
Resultado disso é que a notícia foi recebida com ceticismo
pelos especialistas, pois para estes, o custo estaria abaixo do real e só
poderia ser definido com a realização dos estudos, levando em conta
principalmente os desafios de engenharia que o projeto comportará. Considerando
isso, temem que essa iniciativa nunca
saia do papel, como tantas outras.
Na avaliação de Renato Pavan, membro da consultoria Macrologística,
esses obstáculos naturais elevam o custo do transporte. Ele comparou o custo de
exportar uma tonelada de soja do Mato Grosso até os portos chineses por
diferentes caminhos e concluiu que a soja transportada por ferrovia até o Peru,
e de lá para a China, teria o mais elevado custo logístico entre todos, que
seria da ordem de 325 reais por tonelada. É por isso que afirmo ser o Porto do
Itaqui a opção mais barata, com custos que certamente ficariam abaixo dos 135
reais por tonelada. Esse foi o valor estimado por Pavan para levar a soja pelo Pará,
por um trecho da Ferrovia Norte-Sul entre Açailândia e Vila do Conde (PA),
trecho que nem existe ainda.
Com efeito, Pavan conclui que a ferrovia para o Peru não tem
a menor possibilidade de vingar. Outros especialistas chegaram à mesma conclusão,
tais como Rodrigo Vilaça, presidente da sessão ferroviária da Confederação
Nacional de Transporte (CNT); Paulo
Fleury, presidente do Instituto de Logística e Supply Chain (ILOS) e Paulo Resende, coordenador do Núcleo de
Logística da Fundação Dom Cabral. Portanto, há praticamente uma unanimidade
entre os especialistas.
É impressionante a alienação do governo federal, passando a
admitir levar a sério um projeto como esse, ao invés de investir para aprimorar
a rota existente, com recursos para melhorar a sua operacionalidade e os portos
da região, do qual o mais importante é o Itaqui.
Não bastasse isso, outra coisa me preocupou: nenhum dentre os
especialistas citados aqui se referiu ao Itaqui e sempre à Vila do Conde (PA),
um porto que, no cotejo com o Itaqui, quando da construção da Ferrovia dos
Carajás, se mostrou inferior ao nosso e foi uma das causas pela escolha da
ferrovia ficar no Maranhão, enquanto o minério fica no Pará.
E optam por um trecho ferroviário que hoje não existe em
detrimento à Ferrovia dos Carajás, a mais moderna e eficiente do Brasil, já
existente e em funcionamento.
Creio que as autoridades maranhenses do setor de transporte e
logística deveriam procurar esses especialistas e mostrar a excelência do que
temos aqui – já operacional – entre ferrovia e porto.
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