Auditoria realizada pela Controladoria-Geral da União (CGU) identificou uma cadeia de fraudes praticadas pela Fundação José Sarney ? criada pelo presidente do Senado, José Sarney, para preservar a sua memória ? na execução de um projeto de R$ 1,3 milhão, patrocinado pela Petrobrás. A investigação do órgão federal comprovou o uso, pela Fundação, de notas frias e calçadas (com divergência de valores), transações com empresas fantasmas e de fachada, contratações irregulares, falta de comprovação de serviços e outras falcatruas praticadas no bojo de um projeto cultural que nunca saiu do papel. As irregularidades praticadas na Fundação José Sarney já haviam sido divulgadas em ampla reportagem publicada pelo Estado em 9 de julho do ano passado.
A verba da Petrobrás fora transferida para a Fundação Sarney em 2005. A Petrobrás repassou o dinheiro pela Lei Rouanet, que garante incentivos fiscais a empresas que investem em projetos culturais. A reportagem do Estado revelou que, do R$ 1,3 milhão repassado, pelo menos R$ 500 mil foram parar em contas de empresas prestadoras de serviços com endereços fictícios e até em uma conta paralela que nada tem que ver com o projeto. Parte do dinheiro foi para a TV Mirante e duas emissoras de rádio, a Mirante AM e a Mirante FM, de propriedade da família Sarney. Durante a tramitação do processo de captação de recursos incentivados, o senador José Sarney enviou um bilhete ao então secretário-geral e hoje ministro da Pasta da Cultura, Juca Ferreira, pedindo que o patrocínio fosse "agilizado". Em São Luiz, a reportagem comprovou que o projeto não saiu do papel.
Os auditores da CGU também estiveram na capital maranhense e constataram que a Fundação José Sarney apresentou, em sua prestação de contas, notas fiscais de empresas com endereços falsos. É o caso, por exemplo, do Centro de Excelência Humana Shalom, que supostamente deveria prestar serviços de consultoria à Fundação. O Estado já havia informado, e a CGU comprovou, que tal empresa não existe. "Não foi localizada nem no endereço indicado em suas notas fiscais nem no endereço declarado à Receita Federal", relataram os auditores. Eles encontraram, no entanto, os supostos donos da empresa, mas "o sócio se mostrou evasivo quando solicitado a especificar os trabalhos por ele desenvolvidos". A mesma empresa aparece na relação de contratadas que, segundo a Controladoria, "não executaram serviços" de digitalização do acervo do museu da Fundação ? que tem o senador maranhense pelo Amapá como seu presidente vitalício. As fraudes eram grosseiras, como esta descrita pelos auditores: "Cinco notas fiscais possuem frequência cronológica de emissão incompatível com sua sequência numérica."
Os auditores também encontraram irregularidades na contratação da MC Consultoria ? outra empresa com endereço fictício ? e da Ação Livros e Eventos. A Controladoria requer a devolução do dinheiro pago a essas empresas, por serviços que elas não prestaram. Além disso, de acordo com o demonstrativo de execução de serviços e comprovantes de notas fiscais apresentados ao Ministério da Cultura, a Controladoria-Geral da União descobriu que a Fundação José Sarney teria sonegado R$ 79 mil em notas fiscais; que usara R$ 129 mil, destinados ao projeto, para a manutenção da própria entidade ? R$ 102 mil gastos em energia elétrica, R$ 15 mil em alimentação e R$ 11 mil em impostos ?; que parte do dinheiro da Petrobrás foi usada para contratar empresas de funcionários da própria Fundação.
Recorde-se que o presidente do Senado anunciou, em novembro, a decisão de fechar a Fundação José Sarney, alegando que não havia mais condições para mantê-la funcionando. Não fechou. As irregularidades praticadas na entidade motivaram pedido de abertura de processo no Conselho de Ética no Senado contra o senador pelo Amapá, mas seus aliados arquivaram a representação, sob a alegação de que a reportagem do Estado não poderia ser usada como prova e a CGU ainda auditava as contas do projeto patrocinado pela Petrobrás. Agora, as fraudes estão oficialmente confirmadas.
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