terça-feira, 10 de janeiro de 2012

O AMAPÁ É A SALVAÇÃO

O senador José Sarney deve ter se divertido muito com a história das ‘vozes’ que contou em uma missa de celebração no Convento das Mercês no dia 30 de dezembro último. O senador celebrava a lei da Assembleia proposta pela sua filha, a governadora Roseana Sarney, que transferiu ao estado do Maranhão as despesas e dívidas da Fundação da Memória Republicana. Como todos sabem, a entidade, mais conhecida como Fundação José Sarney, não conseguia equilíbrio financeiro e esteve ao longo dos últimos anos envolvida em escândalos por falta de prestação de contas dos recursos recebidos de vários órgãos do governo federal e inclusive sob investigação pelo Ministério Público. Com a revelação das vozes, ele evitou que o foco ficasse nas críticas a apropriação do prédio, verdadeiro palácio de valor inestimável, que hoje praticamente pertence ao patrimônio de José Sarney. Todo mundo só falou das vozes...

Sarney em seguida, lançou um vídeo em que revelou, para surpresa geral, que é torcedor do Flamengo, certamente inspirado pelo exemplo de Lula, que hoje é confundido com o Corinthians Paulista. Quer fazer o mesmo com o Flamengo, que divide com o time paulista grande parte da torcida brasileira e isso, quem sabe, poderia trazer-lhe alguma simpatia, tão mal amado que é.

Só que há um detalhe muito importante, pois Lula sempre foi aos estádios e Sarney nunca foi visto em nenhum, nem ninguém jamais o ouviu discutindo futebol ou comentando os resultados dos jogos. Não vai ‘colar’. Além disso, ser flamenguista não é apenas decorar o time de 44, que ele, atrapalhado, falou que era o de 45, nem falar o nome dos notórios Ronaldinho Gaúcho e Tiago Neves. É esperteza demais para dar certo e ele deve achar que tudo vale à pena para conquistar um pouco de simpatia. Até o risco do ridículo. Só falta agora vestir uma camisa do Flamengo e ir ao Engenhão assistir a um jogo e ser anunciado nos autofalantes...

Mas tudo tem uma explicação. Vamos a ela:

O mandato do senador José Sarney pelo Amapá se encerra em 2014. No último pleito a que concorreu, a duras penas venceu a disputa eleitoral pelo cargo com a atual deputada estadual Cristina Almeida e, para tanto, teve que mobilizar Lula, que esteve no Amapá por diversas vezes durante a campanha. Não bastasse isso, contou ainda com a valiosa colaboração do empresário Eike Batista, que prometeu mundos e fundos aos amapaenses, principalmente investir pesado no estado, onde não faltariam empregos.

Assim mesmo, Sarney teve que fazer de tudo, inclusive dançar músicas do folclore local na televisão, tentando demonstrar que ninguém era mais amapaense do que ele. Ganhou por pouco, levou um baita susto, um verdadeiro trauma, e naquele momento decidiu que aquele seria seu último mandato, pois mesmo com apoio total do governador e do governo do Amapá, ele sabia que enfrentar Cristina de novo seria demasiadamente arriscado e ele, nem pensar, não poderia se arriscar a ser derrotado em sua última eleição. E no Maranhão, pior ainda! Isto naturalmente a despeito – e por isso mesmo – de ter a própria filha como governadora do estado.

Ele sabe que, sem um mandato no senado, esgota-se sua fonte de poder junto ao governo federal. Viraria um ‘general de pijamas’, sem tropas para comandar, igual a tantos outros políticos importantes que, sem mandato, definham. No Maranhão isso significaria o fim do seu grupo político, que manda há cinquenta anos no estado, pois Roseana não tem prestígio e nem talento para sucedê-lo. Muito menos disposição! Um dilema e tanto para o experiente senador.

Entretanto, no final do ano ele viu uma luz no fim do túnel. E a luz estava no Amapá. Não notaram que na missa referida acima ele disse que a tal voz tinha lhe instruído a perdoar os inimigos? Pois bem, depois que seu grupo político se desfez no Amapá, por conta de muita corrupção, ele perdeu força local e, sem campo de manobra, ponderou que lhe faltava o mínimo de chances de vitória na próxima eleição para senador. Lá, quem ele considera inimigos são o senador João Capiberibe, a deputada Janete Capiberibe e o filho deles, o atual governador Camilo. 

Porém, todos sabem que na verdade é o contrário, pois Sarney conseguiu cassar o mandato anterior do senador Capiberibe, levando junto na cassação o mandato de Janete, numa história do arco da velha que só a justiça eleitoral brasileira é capaz de acreditar, quando quer. Eles nunca fizeram nada a Sarney. O que ocorre é que eles apenas – e isto é pecado supremo para o senador – tinham coragem e disposição para enfrentá-lo. Isto é mais do que suficiente para se tornar um inimigo e tanto. Então, aquela frase, como vamos ver, não foi por acaso.

Vejam que Capiberibe e Janete tiveram ratificado no Supremo Tribunal Federal o direito de exercerem os mandatos para os quais foram eleitos. Janete rapidamente teve o direito respeitado pela Câmara dos Deputados e cedo foi empossada. No senado, contudo, Sarney demorou a dar posse ao senador Capiberibe. Levou meses e meses e, quando o empossou, já havia armado o palco que lhe convinha no futuro próximo. Capiberibe não desconfiava, mas pela vontade de Sarney, tinha um papel importantíssimo no futuro do senador. Era a velha raposa lutando pela sobrevivência...

Depois das dificuldades, Capiberibe só encontrou gentilezas. O governador Camilo, seu filho, esteve duas vezes visitando Sarney em seu gabinete e saiu elogiando o espirito público do anfitrião. Sarney tinha um plano e o seguia, sem desvios. Prevendo o futuro, providenciou um processo de cassação do mandato de Cristina, pretendendo tirar seus direitos políticos para que não possa enfrentá-lo em 2014.

No final do ano passou três dias em Macapá, em cuja estadia visitou o governador no palácio, onde se demorou e posou à vontade para muitas fotografias. No entanto, Sarney não foi lá apenas para as fotografias e sim para dizer ao governador que ele poderia ser um aliado muito importante junto à presidente Dilma e ao governo e poderia ajudar a levar para o estado muitos recursos, a fim de que Camilo pudesse fazer uma ótima administração.

Por exemplo, o senador Capiberibe andou fazendo comentários contrariados de Lobão, já que este não resolvia a federalização da companhia de energia do Amapá, deficitária e em maus lençóis, de modo  que seria um grande alívio financeiro para o estado, se fosse encampada pelo governo federal. Com Sarney como aliado, o assunto poderia ser resolvido rapidamente, assim como muitos outros. O governador conhece bem o senador, mas deve ter ficado tentado.

E agora a fatídica pergunta: o que quer Sarney?

Ora, como ele não pode enfrentar ninguém sem correr um enorme risco de ser derrotado - e isso nem pensar! - pois reduziria mais ainda a sua biografia, ele quer, imaginem só, ser candidato único, dos Capiberibe e também do PMDB, agora na oposição. Assim, conforme vislumbra o senador, não haveria riscos a enfrentar e ele, com o mandato, continuaria com poder junto ao governo federal até 2022.  Mega-Sena da virada!

Enfim, José Sarney voltou para o Maranhão achando que o jogo foi bem jogado e eis o porquê de sua felicidade, cujos eflúvios permitiram-lhe fazer graça ao dizer que ouviu vozes. Só faltou dizer que a tal voz lhe pediu que não fizesse fogueiras, mas sim, que continuasse na política...

Capiberibe já fez um acordo com Sarney no passado e até hoje dói em sua cabeça a paulada que recebeu depois. Só ele pode decidir se cairá ou não novamente nesse canto da sereia. Mas Sarney com poderes, anotem aí, vai acabar por defenestrar seu filho Camilo do governo. Quem viver verá!

Com isso, a oposição maranhense precisa ter muito juízo e não se afobar. Se jogar errado em 2012, queimará suas chances de vitória, chegando fraca em 2014 e permitindo, no mínimo, mais oito anos de domínio da oligarquia, para liquidar de vez o Maranhão.

Lembrem-se de que Sarney poderá estar renovando o seu poder em 2014.

Não podemos errar!