terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

MARANHÃO SÓ CRESCE À NOITE


Thomas L. Friedman é um dos jornalistas mais importantes do mundo, articulista do The New York Times, vencedor de três prêmios Pulitzer e das obras “O Mundo é Plano” e “Quente, Plano e Lotado”. Livros espetaculares, leitura obrigatória.

Ele escreveu neste mês de fevereiro dois excelentes artigos veiculados em jornal com os títulos “Índia, China e Egito” e “A Ascenção da Classe Média Virtual”, que têm tudo a ver com o nosso estado. Ou deveria ter.

No primeiro, ele compara a Índia, a China e o Egito e procura analisar aquele que tem melhores condições de crescer de maneira sustentável nos próximos anos. E parte da seguinte observação: A Índia tem um governo central fraco, mas uma sociedade civil forte. A China tem um governo central forte, mas uma sociedade civil fraca. O Egito tem um governo fraco e uma sociedade civil muito fraca, que foi reprimida por 50 anos, e para a qual foram negadas eleições reais. Mas há uma coisa que todos os três têm em comum: um número imenso de jovens com menos de 30 anos, cada vez mais conectados pela tecnologia, mas com educação muito desigual.

‘Meu ponto de vista’, diz ele, “[é que] dentre os três, aquele que mais prosperará no século 21 será aquele que der prioridade aos jovens. Essa será a sociedade que proverá mais educação aos jovens, empregos e a voz que buscam para atingir seu potencial pleno”. Esta corrida trata-se de “quem é mais capaz de capacitar e inspirar seus jovens para ajudar na construção de uma ampla sociedade próspera”. Os países que fracassarem em fazer isso terão uma massa de jovens não apenas desempregada, mas não empregável. “Eles estarão desconectados em um mundo conectado, em desespero ao verem outros desenvolverem e concretizarem seu potencial e curiosidade".

Mas isso não servirá para nada sem uma melhor governança. “Minha tese” – diz – “é de que a Índia ascendeu apesar do Estado. É uma história de fracasso público e sucesso privado".

 “A Índia cresce à noite, quando o governo dorme”.

“Mas a Índia precisa aprender a crescer durante o dia. Se a Índia consertar sua governança antes que a China conserte sua política, então ela vencerá. (...) É preciso um Estado forte. Em minha última viagem à Índia, eu me deparei com algo que eu nunca havia visto antes: uma comunidade política totalmente nova – a ‘classe média virtual’ da Índia. Seu surgimento explica muito sobre o aumento dos protestos sociais no país, assim como em lugares como a China e o Egito. Essa é uma das coisas mais emocionantes que estão acontecendo no planeta hoje em dia. Historicamente, nós costumamos associar as revoluções democráticas à obtenção, por parte das classes médias ascendentes, de determinados níveis de renda per capita anual – digamos, US$ 10 mil por ano – que permitem que as pessoas se preocupem menos com suas despesas com alimentação e moradia e mais com a obtenção do status de cidadãos com direitos e opiniões para influenciar seu próprio futuro. 

Mas o mais fascinante é o fato da difusão maciça do acesso barato e eficaz à internet, via celulares e tablets, durante a última década. E ela não é impulsionada apenas pelos 900 milhões de celulares em uso atualmente na Índia, nem pelos 400 milhões de blogueiros da China. O escritório do Departamento para o Desenvolvimento Internacional dos Estados Unidos aqui em Nova Déli me colocou em contato com um grupo de empreendedores sociais indianos que os EUA estão apoiando – e o poder das ferramentas que eles estão entregando nas mãos da classe média virtual da Índia, a preços baixos, é de cair o queixo. 

A Gram Power está criando microrredes e medidores de eletricidade inteligentes para fornecer energia elétrica de forma confiável  para as áreas rurais da Índia, onde 600 milhões de indianos ainda não dispõem de uma oferta regular (às vezes, nem de oferta nenhuma) de eletricidade para poderem trabalhar, ler e estudar. Por 20 centavos de dólar por dia, a Gram Power oferece a moradores de vilarejos rurais um cartão de energia elétrica pré-pago capaz de alimentar todos os eletrodomésticos deles. A Healthpoint Services está fornecendo água potável para famílias de seis pessoas por cinco centavos de dólar por dia, além de consultas médicas via internet por 20 centavos de dólar a visita. Atualmente, a VisionSpring está distribuindo exames e óculos de grau para os cidadãos pobres da Índia por preços que vão de US$ 2 a US$ 3 cada. O Instituto para a Saúde Reprodutiva está alertando mensalmente as mulheres a respeito de seus dias férteis usando mensagens de texto – que informam que o sexo sem proteção não deve ser praticado no período indicado para evitar uma gravidez indesejada. E a Digital Green está fornecendo sistemas de comunicação de baixo custo a agricultores e grupos de mulheres indianos para promover um intercâmbio e mostrar a cada um deles suas melhores práticas por meio de filmes digitais projetados em um chão de terra batida.

Estas tecnologias ainda precisam ganhar escala, mas estão no caminho certo. E elas estão permitindo que outros milhões de indianos pelo menos acreditem que fazem parte da classe média e se sintam dotados do poder político que acompanha essa condição social. Drasticamente os custos da conectividade e da educação – tanto que um número muito maior de pessoas da Índia, da China e do Egito, apesar de ainda ganharem apenas alguns dólares por dia, agora têm acesso ao tipo de tecnologia e aprendizado anteriormente associado apenas à classe média e uma sociedade forte, de modo que a sociedade possa fazer o Estado prestar contas. A Índia só terá um Estado forte quando o melhor da sociedade se juntar ao governo, e a China só terá uma sociedade forte quando os melhores mandarins ingressarem no setor privado”.

É por isso que hoje a Índia tem uma classe média de 300 milhões de pessoas, além de outras 300 milhões de pessoas que fazem parte da classe média virtual – um contingente que, apesar de ainda ser muito pobre, exige cada vez mais os direitos, as estradas, os serviços de energia elétrica, os policiais não corrompidos e um bom governo – demandas normalmente associadas às classes médias emergentes. Esses cidadãos estão colocando mais pressão do que nunca sobre os políticos eleitos da Índia para que eles se emendem e governem do jeito certo.

A formação de uma classe média virtual, que não tem a renda da classe média indiana, mas reivindica igual e se porta como classe média o que fez com que essa dobrasse de tamanho e de 330 milhões de pessoas passasse a 600 milhões vai mudar a índia e seu fraco governo. 

E é um país de renda per capita muito baixa e cheio de carências. Igual ou pior ao Maranhão rural. Mas está encontrando soluções de baixo custo.  

A população do Maranhão é a que tem menos acesso a internet entre todos os estados brasileiros e menor acesso a educação de qualidade, sistema de saúde, saneamento e segurança. O governo paralisado e desligado dos verdadeiros problemas que impedem o desenvolvimento do estado, da melhoria de renda e do nível educacional não faz nada, nada mesmo, para mudar as coisas por aqui. Não é carnaval caro e dispendioso que vai mudar.

Esse é o verdadeiro combate à pobreza. Capaz de mudar as coisas.

Uma viagem à Índia para estudar tudo isso seria muito importante. Mas as rotas desse governo são outras. Nada se pode esperar.

Mas a soluções estão aí à espera de governos melhores e comprometidos com o Maranhão.