sábado, 19 de abril de 2008

Estudos revêem efeitos do aquecimento

Folha: Número de furacões pode ser menor no futuro, bem como o impacto do degelo da Groenlândia sobre o nível do oceano. Novas pesquisas não conflitam com as previsões do IPCC, mas ajudam a reduzir incertezas sobre impactos catastróficos.

Três dos efeitos previstos do aquecimento global podem não ser tão catastróficos quanto os cientistas imaginavam. Quatro novos estudos trazem resultados tranqüilizadores sobre a aceleração do degelo na Groenlândia, a probabilidade de mais furacões no futuro e o impacto da acidificação dos oceanos sobre os microrganismos marinhos. Tranqüilizadores, mas só um pouquinho. Dois desses estudos saíram ontem on-line na revista "Science". Eles são assinados pelos americanos Sarah Das, do Instituto Oceanográfico de Woods Hole, e Ian Jouglin, da Universidade de Washington.

Um deles é, na verdade, uma observação assustadora: os cientistas viram um lago de 5,6 km2 de área, formado pelo degelo da superfície do manto glacial da Groenlândia, ser esvaziado em 24 horas. Durante uma hora e meia, a água escorreu por uma fenda a uma vazão de 8.700 metros cúbicos por segundo -mais do que a das cataratas do Niágara. Os cientistas sabem que a água do degelo escorre por fendas chamadas "moulins". Através delas, a água chega até o leito rochoso sobre o qual está assentado o gelo, lubrificando-o. Isso faz com que a capa glacial escorregue mais depressa. Os cientistas sabem também que o aquecimento global está aumentando a quantidade de lagos formados pela água que derrete no verão sobre o gelo. Há o temor de que os "moulins" produzam uma aceleração catastrófica das geleiras da Groenlândia, com o desprendimento de icebergs maciços e uma elevação do nível do mar bem maior do que os 59 centímetros projetados pelo IPCC (painel do clima das Nações Unidas) até o fim do século.

No entanto, um outro estudo da dupla na mesma edição da "Science" procurou avaliar o impacto desse efeito na velocidade de escoamento das geleiras do litoral da Groenlândia.
Os cientistas descobriram que essas geleiras sofrem aceleração muito baixa. "Tomados juntos, os novos achados indicam que, embora o derretimento na superfície tenha um efeito substancial na dinâmica do manto de gelo, ele pode não produzir grandes instabilidades que levem ao aumento do nível do mar", disse Jouglin.

Loucas por ácido

Outro pesadelo dos cientistas é o efeito do aumento na concentração de CO2 no oceano sobre os organismos marinhos. Vários estudos têm mostrado que um mar mais ácido (o gás carbônico em excesso acidifica a água) inibe a formação de carapaças de calcário (carbonato de cálcio) pelo fitoplâncton. Isso é um problema, porque, ao formar tais carapaças, esses micróbios ajudam a "seqüestrar" o carbono do mar. Sem o fitoplâncton, esse seqüestro diminui e o mundo pode ficar ainda mais quente.

Na edição de hoje da "Science", a oceanógrafa Debora Iglesias-Rodríguez, da Universidade de Southampton (Reino Unido), mostra que, ao menos para uma espécie de fitoplâncton, quanto mais ácido, melhor. Em laboratório, ela demonstrou que o cocolitóforo Emiliania huxleyi fica maior quando mais CO2 é dissolvido na água. Como os cocolitóforos em geral respondem por um terço da produção de carbonato de cálcio no oceano, diz Rodríguez, seu estudo significa que uma parte desse seqüestro pode não ficar comprometida -muito embora esse efeito possa estar restrito a uma única espécie de cocolitóforo.


Furacões

Outra questão que o IPCC deixou sem resolver foi atacada por Kerry Emanuel, climatologista do MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusetts).

Emanuel e outros têm observado que águas mais quentes (acima de 27C) aumentam a quantidade de vapor na atmosfera tropical, que é combustível para furacões. Isso produz tempestades mais poderosas, como o Katrina e o Rita, de 2005. Mas não se sabia se o número total de tormentas também cresceria. Em estudo publicado na edição de março do "Boletim da Sociedade Meteorológica Americana", Emanuel diz que não.


O grupo de Emanuel desenvolveu um método novo que espontaneamente "semeia" furacões em modelos climáticos de computador. A técnica foi aplicada com sucesso para reproduzir o número e a intensidade de tormentas nas últimas duas décadas. No entanto, quando aplicada aos modelos do IPCC, ela simula uma freqüência total menor de furacões. Segundo Emanuel, a redução provavelmente ocorre porque o aquecimento global aumenta a chamada "tesoura de vento", a diferença entre a velocidade dos ventos na parte mais alta da troposfera. Ventos fortes mais no alto inibem as tempestades.

O americano Kevin Trenberth, outro especialista em clima e furacões, diz que o estudo é "novo e interessante, mas requer ajustes". Segundo ele, os modelos climáticos são muito grosseiros para enxergar o que acontece com as tempestades que formam os furacões, deixando a atmosfera artificialmente estável. "Há boas razões para crer que haverá menos furacões, mas eles serão mais intensos quando ocorrerem", diz.


Comentário do Blog: A interpretação correta dos problemas decorrentes do aquecimento global vai depender de tempo e do uso de muita tecnologia e de muitas simulações em computadores e da evolução do problema. Por enquanto, estamos discutindo se será mais ou menos pior já que não há dúvidas, infelizmente, que a situação está se deteriorando paulatinamente. Esperamos que a conscientização dos líderes mundiais, principalmente dos países ricos e muito poluidores, aconteça com rapidez maior do que a taxa de agravamento da situação. E que se desenvolvam tecnologias que dotem a humanidade de instrumentos para podermos enfrentá-la antes que atinja proporções incontroláveis.

Infelizmente esse assunto ainda não atingiu a importância que está por merecer.

sexta-feira, 18 de abril de 2008

Novo Paradigma para a Gestão Pública

POR AÉCIO NEVES
Não se trata mais de medir a ação de um governo só pelo que ele investe nas políticas governamentais, mas por seus resultados efetivos

NESTA SEMANA, o Banco Mundial está realizando o seu encontro bianual em Washington (EUA). Entre todos os programas com forte interface com o banco, em várias partes do mundo, Minas Gerais foi o único exemplo de gestão selecionado para ser apresentado como experiência que merece ser conhecida com mais profundidade pelos delegados da instituição.

Desde 2003, Minas vem protagonizando mudanças em uma série de paradigmas da administração pública. Em reconhecimento aos resultados do nosso "choque de gestão", em 2004 o Estado foi capaz de estabelecer um novo modelo de financiamento público ao contratar uma operação de crédito com o Banco Mundial sem a tradicional contrapartida financeira, substituída pelo alcance de metas e resultados em políticas públicas.

Em razão do êxito alcançado na primeira experiência, adensamos ainda mais o modelo, com o maior contrato de financiamento nessa modalidade concedido pelo banco a um governo estadual na atualidade -quase US$ 1 bilhão, cuja contrapartida está representada por avanços efetivos em campos fundamentais da administração do Estado, traduzidos por 24 metas a serem alcançadas a cada ano, até 2010, contratadas formalmente.

Na prática, significa, por parte do Estado, o compromisso de trabalhar com objetivos precisos, programas exeqüíveis e rígido controle de resultados em áreas diversas do serviço público, como equilíbrio fiscal, desoneração da produção e estímulo ao crescimento, qualidade dos gastos públicos e investimentos na qualificação da escolaridade e da assistência à saúde.

Essa modalidade de operação financeira encontra ressonância em uma nova geração de gestores, que já não se satisfaz apenas com "o fazer" na área pública. Não se trata mais de medir a ação de um governo só pelo que ele investe nas políticas governamentais, mas pelos resultados efetivos que decorrem dos investimentos.

Aumentamos o número de equipes do programa Saúde da Família? Que bom! Mas qual é o avanço concreto que isso traz para as condições de saúde da população?

Ampliamos os investimentos em educação? Nada mais legítimo e importante! Mas como esses investimentos melhoraram concretamente a qualidade da escola oferecida às nossas crianças?

O modelo que estabelece como pilar fundamental dos programas e das ações do Executivo o foco no rígido controle dos resultados finais das políticas públicas dá uma contribuição relevante para banir o fantasma dos governos que, muitas vezes, parecem existir focados apenas em si mesmos, nas suas idéias e iniciativas, sem compromisso com tudo o que delas efetivamente deriva. Além disso, esse modelo recupera um valor essencial da democracia -o de que o Estado existe para servir ao conjunto dos cidadão, e não o contrário.

Mais ainda: reconhece, amplia e aprofunda o conceito de que o desenvolvimento não pode ser medido somente pelo saldo positivo dos indicadores econômicos e de gestão financeira. Tão ou mais importantes -e seguramente mais complexos- que estes são os avanços alcançados no campo social, vistos de forma mais ampla.

Afinal, pouco adianta crescer se não distribuímos, com eqüidade, os bens econômicos, sociais e culturais gerados pelo trabalho conjunto da população. Pouco adianta crescer se esse crescimento agrava e realimenta a concentração de renda e de oportunidades e a diferença dramática entre regiões e pessoas.

Por isso, o modelo de Estado inflexionado para a busca de resultados é tão desafiador para todos nós, governantes, especialmente em um país desigual como o Brasil, onde tradicionalmente se associa quantidade de recursos com o êxito da ação. E onde se confunde intenção com resultados e discurso com realidade.

A oportunidade que nos é dada pelo Banco Mundial de apresentar internacionalmente o modelo mineiro de gestão deve ser entendida como a confiança de uma importante agência multilateral de desenvolvimento em uma nova forma de atuar do poder público e também a constatação de que os governos podem fazer muito quando atuam com responsabilidade e comprometimento, mobilizados por desafios e sonhos coletivos e se colocam ao lado, e não acima dos cidadãos.

AÉCIO NEVES DA CUNHA, 48, economista, é o governador de Minas Gerais (PSDB). Foi deputado federal pelo PMDB-MG (1987-1991) e pelo PSDB-MG (1991-2002) e presidente da Câmara dos Deputados (2001-2002).

Comentário do Blog: Eu já escrevi alguns artigos sobre a experiência mineira. Ela é inovadora e realmente muda as práticas administrativas do setor público, que eram atrasadíssimas em relação ao setor privado e não buscavam a eficiência da ação administrativa. Agora, em Minas, os investimentos são feitos para que determinadas metas setoriais sejam alcançadas. Pelo cumprimento das metas, as equipes das secretarias são responsáveis. Se não forem alcançadas, os responsáveis podem ser demitidos. Se alcançadas, as equipes são premiadas. Como gastar dinheiro em um setor, sem definir as metas e nem medir se os resultados foram conseguidos não garante melhora nenhuma para a população, que é quem paga pelos serviços, de forma que esse programas acabam se convertendo em apenas apelos midiáticos. É o “rame-rame” usual da política brasileira que vai atrasando o país. É como fazia aqui a oligarquia nesses 40 anos, principalmente no longo e improdutivo e atrasado governo de Roseana Sarney.

O que o Banco Mundial está fazendo é muito importante, pois premia o governo mineiro pela ousadia e pela racionalidade e acerto de suas ações. Com isso, procura chamar a atenção do mundo todo sobre a gestão mineira. E ao mesmo tempo não exige de Minas contrapartida nem o empréstimo é amarrado a um único setor como é a praxe até hoje.

O secretário da Fazenda de Minas é Simão Cirineu, maranhense de São Bento e que teve papel fundamental no meu governo como secretário de Planejamento. Não é de estranhar que Minas ande tão bem!

quinta-feira, 17 de abril de 2008

Truculência Jurídica do Fisco

Estadão: Órgão encarregado de fazer a defesa dos interesses fiscais da União nos tribunais, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) acaba de divulgar a última versão do anteprojeto da nova Lei de Execução Fiscal, que prevê o bloqueio, sem ordem judicial, de bens de contribuintes inadimplentes. A versão anterior, que fora divulgada no início de 2007, previa o bloqueio administrativo sem qualquer restrição e foi engavetada por causa das contundentes críticas que sofreu dos especialistas em direito tributário, processual e constitucional.

A nova redação do anteprojeto da Lei de Execução Fiscal mantém os amplos poderes concedidos às autoridades fiscais previstos pela versão anterior. A proposta da PGFN autoriza os procuradores fazendários a promover o bloqueio administrativo dos bens de contribuintes inadimplentes, recorrendo até mesmo ao sistema do Banco Central (Bacen-Jud), que permite a penhora online das contas bancárias, às quais terão acesso. No entanto, a nova versão prevê que o bloqueio sem ordem judicial será provisório.

Atualmente, há cerca de 2,7 milhões de ações de execução fiscal nas diferentes instâncias das Justiças federal e estaduais. Elas constituem um dos principais fatores responsáveis pelo congestionamento do Poder Judiciário. As ações de execução fiscal representam 40% do número de processos em tramitação nos tribunais, chegando a 50% em algumas unidades da Federação. O tempo médio de tramitação de uma ação de execução fiscal é hoje superior a 16 anos. Com as medidas que acaba de propor, a PGFN quer encerrar essas ações em até cinco anos.

A morosidade na tramitação das ações de execução fiscal sempre foi objeto de duras críticas de procuradores da Fazenda e de juízes de varas fiscais. Eles atribuem parte do problema à lentidão da própria Receita Federal, que costuma demorar entre 4 e 5 anos para iniciar a cobrança. Nesse prazo, contudo, a maioria das empresas devedoras fecha ou, então, desfaz-se de qualquer patrimônio que possa ser bloqueado para efeitos de penhora.

Diante das críticas ao caráter altamente arbitrário da versão anterior do anteprojeto da nova Lei de Execução Fiscal, a PGFN decidiu manter o bloqueio de bens sem ordem judicial, por decisão de procuradores fazendários, mas incluiu um dispositivo que os obriga, em 30 dias, a ajuizar uma ação para que a Justiça avalie a decisão tomada. Com isso, o bloqueio administrativo cai, se não for confirmado judicialmente. Além disso, se a ação for impetrada fora de prazo, o bloqueio administrativo perde efeito. No caso do sistema Bacen-Jud, do Banco Central, o anteprojeto prevê que, se a Justiça não reconfirmar a penhora online em dez dias, o bloqueio perde a validade.

O anteprojeto também prevê a criação de um Sistema Nacional de Informação Patrimonial dos Contribuintes com o objetivo de facilitar a localização e o bloqueio do patrimônio e renda dos contribuintes - uma iniciativa até certo modo redundante, pois a Receita já dispõe dessas informações por meio das declarações de imposto de renda das pessoas físicas e jurídicas. O principal interesse da PGFN é firmar convênios com os governos estaduais para ter acesso aos registros imobiliários. O banco de dados também deve reunir informações de cartórios, departamentos de trânsito, Agência Nacional de Aviação Civil, Comissão de Valores Mobiliários, bolsas de valores e do Instituto Nacional da Propriedade Industrial, para permitir o bloqueio de registros e patentes. Com essas medidas, a PGFN pretende concentrar sua atuação apenas entre os devedores que tenham patrimônio imobiliário e financeiro para ser bloqueado e penhorado.

É compreensível que, no combate à sonegação e na cobrança de impostos devidos pelos contribuintes, as autoridades fiscais racionalizem seu trabalho e disponham de instrumentos legais eficientes. No Estado de Direito, contudo, não se pode admitir que os fins, por mais nobres que sejam, justifiquem meios arbitrários. A nova redação do anteprojeto da Lei de Execução Fiscal, embora mais branda que a anterior, contém vários dispositivos que podem levar à quebra de sigilo bancário e a um perigoso sistema de informações patrimoniais dos contribuintes, sob controle do Fisco e em detrimento dos direitos fundamentais do cidadão.

Comentário do Blog: Os nossos representantes no Congresso Nacional precisam estar atentos para evitar que projetos como esse virem leis. Tornou-se natural, tal a insistência, que os órgãos fazendários do governo federal tentem facilitar o seu trabalho avançando sobre os direitos individuais de resguardo do sigilo bancário e fiscal, que são garantias constitucionais.

Tentam dar um by-pass na obrigatoriedade da autorização judicial, para acesso a tais sigilos, e dar essa prerrogativa ao próprio órgão arrecadador, com evidente prejuízo aos cidadãos que teriam suas contas abertas administrativamente apenas por suspeita de algum técnico do fisco, na tentativa de arranjar provas contra o contribuinte, e fazer o processo depois. Seria a banalização da quebra de sigilo bancário e fiscal, como está acontecendo hoje com o sigilo telefônico, que é quebrado antes de qualquer culpa formada, tentando assim provar alguma coisa contra o indivíduo.

A justiça, principalmente os tribunais superiores, tem derrubado todas as tentativas anteriores, mas o fisco todos os anos tenta novamente.

Vamos ficar atentos.

quarta-feira, 16 de abril de 2008

Alimento à hipocrisia

Folha: Tom apocalíptico sobre carestia da comida é exagero; subsídios de países ricos dificultam revolução agrícola global

Que instituições multilaterais, como as Nações Unidas, o FMI e o Banco Mundial, perdem importância não é segredo. O inusitado é que, agora, tentem compensar essa diminuição de peso relativo com uma gritaria apocalíptica em torno da inflação dos alimentos -e de sua relação com os biocombustíveis.

A fiar-se nas palavras de representantes dessas instituições, o mundo parece à beira de um cataclismo. Legiões de famélicos seriam produzidas a cada centavo de alta no preço das commodities; dezenas de conflitos seriam fomentados por causa da falta de comida. Nesse cenário, os biocombustíveis seriam mesmo "um crime contra a humanidade", como disse ontem o relator da ONU para o direito à alimentação, Jean Ziegler.

Há, evidentemente, um exagero estrondoso nesse tipo de avaliação. Ela perde de vista a hierarquia dos fatores que concorrem para a inflação no preço da comida, fenômeno mundial. A parcela de grãos ora utilizada para a produção de combustível, uma fronteira tecnológica no mundo rico, não tem escala para produzir, sozinha, elevação tão vultosa e abrangente no preço dos gêneros alimentícios.

O ganho contínuo de renda das populações mais pobres do mundo -na Ásia, na América Latina e na África-, as quebras de produção em países que são grandes exportadores agropastoris, a disparada no preço da energia e a especulação financeira contra o dólar são os fatores preponderantes para a inflação da comida. O uso crescente do milho, nos EUA, para a produção de álcool também ajuda no processo, mas de modo bem mais restrito.

Abortar investimentos em biocombustíveis, portanto, seria a terapia errada para ampliar em ritmo suficiente a oferta de alimentos. A abordagem correta seria liberar as forças produtivas agrícolas, em nível mundial, de constrangimentos que atravancam os ganhos de produtividade no setor. Leia-se: acabar com os subsídios a lavouras e rebanhos nas nações desenvolvidas.

Se esse imperativo vigorasse, países africanos miseráveis já teriam passado de importadores a exportadores de comida; uma revolução nas técnicas rudimentares adotadas em vastas regiões do mundo em desenvolvimento teria multiplicado o volume colhido e abatido; o biocombustível para complementar a demanda global por energia seria obtido em terras tropicais que hoje têm baixíssimo ou nenhum aproveitamento; todo o milho produzido nos Estados Unidos seria destinado à alimentação.

Os governos de países ricos de repente ficaram preocupados com o impacto da carestia alimentar na pobreza global. Que ajam, então, para resolver o problema e ponham um fim às barreiras agrícolas.

Comentário do Blog: Essa é uma típica agenda falsa que se aproveita de fatos verdadeiros para tentar atingir objetivos inconfessáveis. O etanol está sendo escolhido e aí juntam tudo para fazer confusão. Principalmente porque a produção de etanol ainda é muito baixa e os preços dos alimentos estão subindo por outras causas. Aumento de renda dos pobres, dólar em baixa no mundo inteiro e, principalmente, o protecionismo dos países europeus e dos Estados Unidos, com suas altíssimas barreiras alfandegárias que prejudicam países competitivos na produção de alimentos, como o Brasil e como podem ser países africanos. Tudo para proteger os produtores locais, que não tem condição de competir conosco. Se quisessem realmente baixar os preços dos alimentos, bastava acabar com as barreiras alfandegárias para a importação de alimentos que rapidamente Brasil e a África iriam multiplicar por muito sua atual produção e inundar o mundo de alimentos.

Quanto ao etanol, só os Estados Unidos produzem etanol do milho, trocando alimentos por energia. Essa proibição, sim, é vantajosa ser for feita. O Brasil não tem nada a ver com isso. Na verdade, os produtores de petróleo não querem perder espaço e têm medo de ficar de fora do mercado, pois não produzem etanol. É a velha história de sempre. O mais forte querendo impor agendas aos mais fracos para tirar vantagens sempre. Esse editorial é muito lúcido e por isso muito bom. É da Folha de São Paulo.

segunda-feira, 14 de abril de 2008

Armação muito Limitada

A trama armada pelo senador José Sarney para tirar o governador Jackson Lago do governo começa a enfrentar a realidade. Isso ficou muito claro na oitiva das testemunhas de acusação arroladas por Sarney. Segundo o advogado de Jackson Lago, o experiente e competente Flavio Dino, o processo é inconsistente e o depoimento das testemunhas de acusação foi pífio.

Cai assim mais uma tentativa de tornar juridicamente consistente o processo para cassar, na marra, o diploma do governador. Até um poste sabe no Maranhão que Sarney nenhum ganha mais eleição majoritária no estado. Talvez, se fizerem como José Sarney, que se mandou para o Amapá, ainda consigam alguma coisa. Mas aqui no Maranhão não!

A medida que a educação avança e melhora no estado, e o povo vai tomando consciência do que aconteceu aqui nestes 40 anos de domínio absoluto dos Sarney, e não gosta do que vai conhecendo da oligarquia, o voto em alguém da família vai definhando. Só se mantiveram no poder, nesses anos todos, pelo medo que despertavam nos políticos, empresários e muitos pais de família que eram funcionários públicos, além, é claro, do bombardeio da mídia miranteana, deturpando, criando factóides, mentindo, caluniando. A televisão mantinha manietados os que precisavam de publicidade, como alguns artistas, alguns intelectuais, empresários em geral. Não queriam entrar no livro negro da família.

Como se não bastasse todo esse poder, desfrutam de muita força em todos os poderes institucionais, o que sempre foi usado como chantagem, intimidando todos aqueles que tivessem problemas a resolver nessas instituições. Isso sempre foi ampliado nas eleições e são inúmeros os casos de políticos que tiveram que se submeter para não perderem os mandatos e outras “cositas mas”.

Era poder demais concentrado em uma família, mais precisamente em José Sarney, que, como presidente do Senado duas vezes, e presidente da República, gerou forças poderosas a seu favor também no cenário nacional. A tal ponto de hipnotizar o presidente da República, a quem também chantageou, ameaçando tirar licença do Senado junto com a filha e amigos se o Lula não nomeasse o presidente da Eletrobrás, que ele impusera, como noticiou Dora Kramer, colunista do jornal “O Estado de São Paulo”. Inesperadamente, o presidente aceitou a afronta e o indicado foi nomeado.

Toda essa força foi causadora da tentativa desesperada de tirar Jackson Lago do governo, de qualquer maneira, com provas ou não, com razão ou não. Achava que podia quase tudo, só uma coisa ele já tinha certeza que não podia mais: ganhar eleições aqui. Daí foi um pulo juntar advogados dispostos a montar dossiês que, sob as ordens de Chiquinho Escórcio, passaram a percorrer o interior do Maranhão, tentando montar histórias com alguma aparência de coerência e aí atropelar prazos em uma corrida maluca para tirar o governador. São muitos os advogados contratados para a empreitada, os custos são imensos, com passagens aéreas, estadias, deslocamento por dias e dias consecutivos. Uma pequena fortuna! Cabe a pergunta: quem banca tudo isso?

A única coisa que José Sarney não aceita é a afronta que teve que engolir. A derrota nas urnas, mesmo chamando Lula para lhe ajudar a conseguir votos para Roseana. Só que ele não viu que a vida do povo estava melhorando e que no meu governo a população teve escolas à disposição, casas de alvenaria cobertas com telha, água encanada, fossas sanitárias, saúde da família e hospitais regionais, Pronaf, Casas da Agricultura Familiar, combate a febre aftosa, recursos para atividades produtivas com recursos do Banco Mundial etc e programas como o Mutirão da Cidadania, Saúde na Escola e tantos outros. O povo viu que havia alternativas políticas com pessoas que sempre pautaram sua atuação em programas que melhoravam a sua vida. Pela primeira vez sentiram isso e aí votaram em quem lhes ajudava. E Sarney nunca ajudou o povo do Maranhão.

O processo montado nessas condições tinha furos para todos os lados. Os advogados e Chiquinho foram descobertos em Goiânia quando foram dar uma mãozinha para o aliado Renan Calheiros em uma desastrada operação descoberta pela revista Veja, em forte matéria publicada meses atrás. Isso faria qualquer um desistir, menos Sarney, certo de que seu imenso poder prevaleceria sobre o desejo do povo, cego que está pelo desejo de vingança e poder.

Aqui no Maranhão, ficava-se sabendo, quando Chiquinho e os seus advogados chegavam e viajavam para o interior com a missão de montar depoimentos, dossiês e atrás de testemunhas “idôneas” para dar um aspecto de veracidade ao processo. Ao mesmo tempo, jornalistas que trabalham com o senador recebiam a missão de informar aos meios de comunicação que o processo contra o governador Jackson revelava provas tão substanciais que era apenas questão de tempo a cassação de seu diploma, para espanto dos que conheciam o processo e sabiam que era inconsistente. Tentavam preparar o ambiente para dificultar a defesa de Jackson. Ao mesmo tempo, à boca miúda, espalhavam que Jackson Lago era um bandido. Em suas palavras, qualquer semelhança com Fernandinho Beira-Mar, era mera coincidência.

Agora, depois de tanto suspense e tanta noticia falsa, chegou a hora das testemunhas adestradas previamente na mansão do próprio comandante, com lição individual e treinamento ministrado pelos advogados, com o fim de impressionar os julgadores. Mas o resultado foi o que sabíamos que iria acontecer. Nada adianta se tudo é mentira ou inconsistência e as próprias testemunhas de acusação, sabendo como todo o processo foi montado, não tinham a segurança necessária para conseguirem um mínimo de credibilidade no que diziam. Um desastre.

A verdade sempre prevalece. Vantagem inicial conseguida por meios escusos, nada garante.

Vão perder mais uma vez. Grande escolha, governador, a de Flavio Dino para seu advogado. Antes tarde do que nunca.

Um grande abraço, Lourival!

A Armadilha da Demanda Artificial

Deu em O Estadão: Desde o ano passado vimos criticando a política do governo de criar uma demanda artificial para obter maior crescimento econômico. Com isso, o que se criou foi uma situação muito desconfortável para o governo: não pode retirar de repente os incentivos à demanda, que contribuíram para aumentar as importações, por sua vez, estimuladas pela valorização do real - e o País corre o risco da acumular déficits nas transações correntes do balanço de pagamentos.

O primeiro estímulo a um aumento artificial do poder aquisitivo foi a criação do crédito consignado em folha de pagamentos, que, dando maiores garantias à instituição financeira, opera com taxa de juros muito inferior à do crédito pessoal e acabou estendido aos aposentados. Representa, hoje, em torno de 57% de todo o crédito pessoal. O propósito era positivo, mas a medida deveria ter sido acompanhada por uma limitação estrita da parcela empenhada dos vencimentos do tomador.

Com a redução das taxas de juros - apesar de continuarem elevadas, em termos relativos - se criou uma competição de ofertas em que as empresas procuram estender ao máximo os prazos dos financiamentos. Cresceram também as operações longamente parceladas nos cartões de crédito, que chegaram a 52% de todo o movimento de vendas do comércio. A tudo isso acrescentou-se o crédito imobiliário - facilitado e barateado -, que, por sua própria natureza, é de longo prazo.

A velocidade com que se criou um grande aumento da demanda (sustentada ainda pela política assistencial do governo) não permitiu uma adaptação rápida da oferta interna ao volume da demanda doméstica, com a diferença sendo coberta por importações, graças a uma taxa cambial valorizada que permitia adquirir bens importados a um custo menor do que os produzidos pela indústria nacional. Surge, assim, uma situação delicada para a balança comercial, que enfraquece as contas externas.

É muito difícil, para o governo, recuar dessa política de estímulos artificiais à demanda, como ficou claro com a reação negativa e peremptória do presidente da República à idéia do ministro da Fazenda de reduzir os prazos do crédito.

E ainda há outra ameaça: a do crescimento da inadimplência, caso ocorra queda da atividade econômica. O exemplo dos EUA mostra que a inadimplência atingiu o maior nível em 16 anos, não apenas no crédito imobiliário, mas também nos cartões. Caberia meditar sobre esse exemplo.

Comentário do Blog: Parece que além da sorte, ou dedo de Deus, como diz Delfim Neto, Lula resolveu turbinar resultados de uma demanda interna que pode ser artificial como denuncia esse artigo do jornal “Estado de São Paulo”. Seja como for, se é artificial, um dia terá fim. E como será esse fim? Como o que aconteceu nos Estados Unidos com o crédito imobiliário? Creio que não, a situação tem diferenças muito grandes. Mas tudo dependerá de como o governo vai equilibrar esse desequilíbrio latente na economia brasileira. Seja como for, o povo adorou e Lula “foi para a galera”. Tomara que tudo termine bem, embora o endividamento das famílias vá chegando a 9 meses de salário e muita gente já esteja contraindo empréstimos para pagar empréstimos mais antigos. Deus vai ter que reconfirmar a sua nacionalidade brasileira!