terça-feira, 9 de junho de 2015

A QUESTÃO DA MAIORIDADE PENAL

Desde a assunção de Eduardo Cunha à presidência da Câmara dos Deputados que a casa se tornou, finalmente, protagonista no debate e deliberação dos grandes temas nacionais. Projetos importantes que ocupavam as gavetas da Câmara, alguns por mais de dez anos, foram finalmente levados à deliberação e votados.

Cito aqui o projeto das emendas compulsórias ao orçamento que deu grande liberdade aos parlamentares, que se livraram da ameaça de ou votar com o governo ou não ter liberadas as suas emendas, em um ato de chantagem explícita que diminuía o Congresso.

Há também o projeto da terceirização, outro projeto importante aprovado, que moderniza o mercado de trabalho brasileiro, dando garantias e proteção a mais de quinze milhões de trabalhadores que exerciam suas atividades desprotegidos. Além disso, cito o aumento da idade da aposentadoria compulsória nos Tribunais Superiores, mudando a idade limite de 70 para 75 anos e que deverá ser estendida a todo o funcionalismo no futuro, mantendo homens e mulheres experientes e competentes no exercício de seus deveres contribuindo com o país.

Outro exemplo foi a votação reforma eleitoral, ainda não concluída, mas que, pelo que já foi decidido, revelou-se muito importante pelo menos para impedir que o Supremo Tribunal Federal, sem mandato para isso, continuasse a querer legislar sobre assuntos eleitorais. Com isso evita-se que uma excrescência comandada por parte do PT virasse Lei, como a questão da votação em lista, em que o eleitor votaria apenas na legenda e o partido então escolheria quem seriam os deputados, tirando esse direito do eleitor. Isso sem falar em finalmente acabar com o direito à reeleição, fonte de tantos desvios de conduta e manutenção de grupos no poder. E ainda vamos votar pontos importantes da reforma. Fiz essa digressão para citar apenas algumas deliberações mais importantes.

Agora é a vez da Lei da Maioridade Penal. Esse tema tem apoio de mais de noventa por cento da população, enquanto que a manutenção da situação atual encontra guarida na ideologia de grupos de opinião e partidários. Se aprovada, predomina a ideia de levar a decisão final a um Referendo Popular. A nação, não só os deputados e senadores, devem decidir essa questão tão importante para todos. Devo votar a favor da redução da idade, pressionado pelos fatos do dia a dia, pelo depoimento de mães desesperadas que não sabem mais o que fazer com filhos cooptados pelo crime, e pela crueldade de muitos desses jovens cobertos pela imunidade que atualmente gozam.

O mundo inteiro pensa diferente do Brasil. E é só a ideologia que produz estatísticas, dizendo que é pequena a proporção de menores em crime de homicídio, mas essas estatísticas não resistem a uma análise acurada. Cito o exemplo do governo federal, envolvido ideologicamente com a questão, que tenta manter o status quo e faz referência a dados em que os menores de idade cometem apenas 0,5 por cento dos homicídios, atribuindo a informação ao Fórum Brasileiro de Segurança Pública. A entidade, porém, nega ter elaborado esse cálculo. A Folha de São Paulo pesquisou o assunto e verificou que a taxa de menores em homicídios em 2014 não foi insignificante. Em sete Estados, é igual ou superior a 10 por cento. No Distrito Federal os menores são responsáveis por 30 por cento das mortes, no Ceará a taxa chega a 31 por cento  e por aí vai.

Ainda sobre o assunto, vejam o que diz Ferreira Gullar, esse grande intelectual e poeta maranhense, que foi esquerdista quando jovem, mas que se libertou da senda estreita que a ideologia reserva àqueles que as adotam, abstraindo-se de ter pensamento próprio. Em artigo publicado na Folha de São Paulo de 12/04/2015, intitulado “Questão Difícil”, ele expõe o seguinte:

“A questão da maioridade penal está em pauta, trazida à discussão pela proposta, em apreciação no Congresso, de reduzi-la de 18 para 16 anos. O tema é polêmico e, em alguns casos, passional, uma vez que envolve desde valores jurídicos até posições ideológicas e religiosas. Isso sem falar na confusão que ultimamente se armou em volta do tema, suscitando os argumentos mais descabidos e contraditórios.

De minha parte, dado o modo como costumo focalizar os problemas, tento ir ao mais simples da questão e me pergunto: será mesmo verdade que uma pessoa de 16 ou 17 anos de idade, se roubar ou matar, não tem noção do que está fazendo? Duvido muito.

Li recentemente a declaração de um ministro do Supremo Tribunal Federal, contrário à redução da maioridade penal, afirmando que "cadeia não conserta ninguém". Ou seja, na opinião dele, não adianta prender um jovem que cometeu um crime, porque isso não vai melhorá-lo; ao contrário, vai piorá-lo, já que sairá de prisão mais criminoso do que entrou.

Confesso que essa afirmação me deixou surpreso, sobretudo por vir de alguém que deve ser mestre na questão penal. Minha surpresa decorre do fato de que melhorar, educar os jovens não é a função da cadeia e, sim, da escola. Se a cadeia conseguir educar, tanto melhor, mas sua finalidade precípua não é essa e, sim, a de afastar o criminoso do convívio social para preservar a segurança e a tranquilidade dos demais cidadãos.

Do contrário, a punibilidade das leis será desqualificada por não cumprir com um objetivo que não é o seu. Cabe ainda observar que, se o criminoso só é preso depois que comete crime, não é a cadeia que o torna criminoso. É generalizada a opinião de que a prisão, além de não educar o condenado, o piora, isto é, de que ele sai de lá mais criminoso do que entrou, particularmente se for jovem.

Não duvido, mas não vejo aí razão suficiente para que se deixe de prender quem assalta ou mata. No meu precário entendimento, a punição do ato delituoso é o recurso de que dispõe a sociedade para fazer justiça, porque, se ela não pune quem transgride as normas sociais, está sendo injusta com quem as respeita. Mais, estaria estimulando a transgressão daquelas normas, sem as quais a sociedade se torna inviável. Um argumento muito usado para mostrar que a prisão do criminoso é inútil estaria no aumento da reincidência dos delitos, ou seja, a cada dia, é maior o número de ex-prisioneiros que voltam a cometer infrações e retornam às cadeias.

Vamos nos deter no exame desse argumento. Todos sabemos que as prisões brasileiras são verdadeiros infernos, superlotadas e, consequentemente, o pior lugar onde qualquer ser humano gostaria de viver. Pois bem, apesar disso, o criminoso, que experimentou esse inferno, insiste em cometer novos crimes, sabendo que, cedo ou tarde, terminará voltando para lá.

Pergunto a você: tem lógica isso? Mais lógico seria o infrator ganhar tanto horror à prisão que, uma vez livre dela, evitasse fazer qualquer coisa que o devolvesse para lá. Mas não é isso o que ocorre. Como demonstram as estatísticas, ele volta a transgredir e volta para o inferno da cadeia.

Qual a conclusão a tirar disso, senão que a prática do crime é inerente a sua personalidade? Ele sabe que erra ao assaltar ou matar e sabe também que provavelmente retornará à prisão, mas evitá-lo parece estar acima de suas forças. Seja por que razão for, prefere correr o risco de retornar ao inferno do cárcere a se submeter às normas que regem o convívio social.”

É preciso dizer mais alguma coisa?