segunda-feira, 25 de agosto de 2008

Semi-Árido Maranhense: Um Grande Bolsão de Pobreza do Nordeste e do Brasil

Reproduzo abaixo artigo do Professor José Lemos:




Semi-Árido Maranhense: Um Grande Bolsão de Pobreza do Nordeste e do Brasil


A população do Nordeste tem, proporcionalmente, o maior contingente de excluídos do Brasil. Além de outras características, as populações pobres apresentam uma grande participação das despesas com alimentação no seu dispêndio. Desta forma, a agricultura desempenha um papel bastante relevante para a região, quer como absorvedora de mão de obra, quer como provedora de segurança alimentar e de renda monetária.

Dessa forma, as atividades agrícolas continuam desempenhando uma grande função econômica e social para a região como locadora da força de trabalho regional, haja vista que os setores de transformação e de serviços exigem um melhor nível de qualificação da mão de obra e, por isso, os trabalhadores rurais que emigram tem dificuldade de encontrar colocação nos empregos que são normalmente oferecidos nas zonas urbanas. Por esta razão, se for promovido o desenvolvimento rural estarão sendo encontradas algumas das possibilidades que viabilizam a opção das famílias rurais de permanecerem nessas áreas.

Mas no Nordeste, em geral, prevalecem condições naturais desfavoráveis para o cultivo de lavouras e para a criação de animais. Essas dificuldades se sobressaem nas suas Zonas Semi-Áridas. Nessas áreas, as dificuldades associadas à produção agro-pastoril e à promoção do desenvolvimento rural se elevam em relação às demais áreas da própria região e do Brasil. Isto é causado pelas elevadas temperaturas, pelos solos, que tem fertilidade natural comprometida, por regime pluviométrico irregular espacial e temporalmente, além de um elevado processo de depredação dos seus recursos naturais. Por tudo isso há dificuldades de acesso à água para seres humanos, animais e plantas, e a conseqüência é a queda, e até o desaparecimento da produção agrícola em vários locais. Não tendo como sobreviver as famílias tendem a aventurar-se em outros lugares.

Este cenário que se repete por longos anos no Semi-Árido do Nordeste e que é apenas reconhecido, em nível de Governo Federal, a partir do Piauí até a Bahia, também afeta pelo menos 46 municípios maranhenses. Esses municípios que se concentram nas microrregiões do Baixo Parnaíba, Munim-Lençóis e Sertão Maranhense atingem 1,29 milhões de habitantes (21,1% da população do Estado). A partir dos dados do IBGE para 2005 (últimos disponíveis) calculou-se que o PIB médio desses 46 municípios era de R$ 2.454,41. Em torno dessa média gravitavam valores que oscilavam entre R$ 1.325,45 em Santa Quitéria e R$ 4.079,56 em Loreto. Como o salário mínimo em 2005 era de R$ 300,00 por mês ou R$ 3.600,00 por ano, em apenas mais um município, além de Loreto, a renda média superava um salário mínimo: Caxias cuja renda per capita anual era de R$ 3.662,14.

A taxa atual de analfabetismo da população maior de 10 anos desses 46 municípios é de 26,02%, oscilando entre 17,12% em Timon e 36,6% em Belágua. Como conseqüência a escolaridade média é baixa, de apenas 4,6 anos. Belágua tem a menor escolaridade média (4,1 anos), e Timon tem a maior escolaridade média que não passa de 5,1 anos.

Nesta que é a “Semana Mundial da Água” a Organização das Nações Unidas (ONU) reuniu autoridades mundiais em Estocolmo para discutir o acesso à água e ao saneamento. Naquele encontro foi denunciado, com todo o alarde que o fato requer, que 20% da população do mundo está privada de água de qualidade e que, em 2025, este percentual deverá ascender para 30%. Segundo este mesmo documento “33% da população do mundo carece de instalações sanitárias”. No Semi-Árido maranhense 45,6% da população não tem acesso à água de qualidade e 51,6% não tem instalações sanitárias adequadas. O IDH é de 0,673e a população socialmente excluída é de 46,0%. Portanto, o Semi-Árido maranhense em 2008 está em situação pior do que os valores projetados pela ONU para 2025.

Concluindo, depreende-se que se tratam de 46 municípios muito carentes que por isso precisam receber tratamento diferenciado. Imagina-se que projetos de reflorestamento para as suas áreas degradadas, cultivo de cajueiro anão precoce com implementação de miniusinas de beneficiamento de castanhas, recuperação das matas ciliares dos seus corpos d’água de superfície, criação de caprinos, de ovinos e de abelhas, juntamente com atividades não agrícolas, poderiam ser algumas das possíveis âncoras para deslanchar um circulo virtuoso de mitigação da pobreza prevalecente. Mas como nos ensina o Professor Alain De Janvry da Universidade da Califórnia, nada disso é possível de ser feito sem a intervenção indutora dos Governos nas suas instâncias Federal, Estadual e Municipal. Esta ação deve começar pela intensificação da demanda política por parte da Representação em Brasília para que haja o reconhecimento urgente do Semi-Árido no Estado por parte do Governo Federal, haja vista que tecnicamente não há mais o que discutir.

=================
José Lemos é Engenheiro Agrônomo e Professor Associado na Universidade Federal do Ceará. lemos@ufc.br. Autor do Livro “Mapa da Exclusão Social no Brasil: Radiografia de Um País Assimetricamente Pobre”.

Nenhum comentário: