sábado, 12 de dezembro de 2009

Celso de Mello Vê Censura como Ato Discriminatório contra o ''Estado''

Ministro recordou apreensão do jornal em 13 dezembro de 1968, data da edição do Ato Institucional número 5


Ao proferir o seu voto, o decano do Supremo Tribunal Federal (STF), Celso de Mello, remontou ao período do Império, se referiu a convenções internacionais e lembrou decisões dos próprios colegas para repudiar, do começo ao fim de sua fala, a proibição imposta ao Estado. "A censura traduz a ideia mesma da perversão das instituições democráticas, em um regime político onde a liberdade deve prevalecer", disse. Para ele, a mordaça é um "retrocesso político-jurídico", que devolve o País "ao período colonial".

O ministro recordou a apreensão do Estado na madrugada de 13 de dezembro de 1968, com a entrada em vigor do Ato Institucional nº 5 (AI-5), e citou o editorial Instituições em Frangalhos, mantido pelo diretor e proprietário do jornal, apesar das pressões dos militares. "Julio de Mesquita Filho publicou um editorial, eu mesmo tive acesso a ele. A edição foi apreendida pelos órgãos de repressão."

Mello destacou que a decisão do Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJ-DF) só impede o Estado de exercer a sua função, enquanto os demais veículos trabalham normalmente. "Outros órgãos de comunicação social continuam divulgando e não sofreram essa interdição. Portanto, essa interdição é também, além de arbitrária, além de inconstitucional, é uma decisão discriminatória. E incide sobre um órgão da imprensa que, já no final do Segundo Reinado, então A Província de São Paulo, fez da causa da República um de seus grandes projetos."

Ao traçar um paralelo com os anos de chumbo, Mello fez um alerta: "Entendo particularmente grave e profundamente preocupante que ainda remanesçam, sim, no aparelho de Estado, determinadas visões autoritárias que buscar justificar, pelo exercício arbitrário do poder geral de cautela, a prática ilegítima da censura."

Ainda de acordo com o ministro, "quase todas as Constituições do Brasil expressamente repudiaram a censura". "Contavam com uma cláusula de veto explícito", completou.

TRATADOS

Mello começou o seu voto dizendo que ontem se celebrava uma data histórica - "61º aniversário da promulgação, em Paris, pelas Nações Unidas, da Declaração Universal dos Direitos da Pessoa Humana".

"O artigo 19 do estatuto contempla direito à liberdade de opinião e expressão. Inclusive a prerrogativa de procurar, de receber e de transmitir informações e ideias", acrescentou.

O decano do tribunal referiu-se, depois, ao Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, aprovado em 1966, "sob a égide das Nações Unidas". Fez, por fim, referência ao Pacto de São José da Costa Rica, firmado em 1969, "tão temido pelo regime militar", que "proclama, em seu artigo 13, que toda pessoa tem direito à liberdade de pensamento e de expressão".

Segundo o ministro, todos esses tratados foram endossados pelos colegas de Supremo no julgamento que derrubou a Lei de Imprensa, em 30 de abril.

Em seguida, ele lembrou o escritor inglês John Milton. "Em discurso pela liberdade de imprensa, no Parlamento da Inglaterra, após destacar a absoluta inutilidade da censura, salienta: "A censura obstrui e retarda a importação da nossa mais rica mercadoria, que é a verdade"."

"A liberdade de informação, portanto, tem um aspecto nuclear em nosso sistema jurídico", insistiu Mello, na leitura do voto. "O cidadão tem a prerrogativa de receber informações sem qualquer obstrução, sem qualquer interferência por qualquer órgão de poder público, seja do Poder Executivo, seja do Poder Legislativo, seja do Poder Judiciário."


FRASES

Celso de Mello - Ministro do STF

"A censura traduz a ideia mesma da perversão das instituições democráticas, em um regime político onde a liberdade deve prevalecer"

"Outros órgãos de comunicação social continuam divulgando e não sofreram essa interdição. Portanto, essa interdição é também, além de arbitrária, além de inconstitucional, é uma decisão discriminatória. E incide sobre um órgão da imprensa que, já no final do Segundo Reinado, então A Província de São Paulo, fez da causa da República um de seus grandes projetos"

"Entendo particularmente grave e profundamente preocupante que ainda remanesçam, sim, no aparelho de Estado, determinadas visões autoritárias"

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