Fernando Gabeira, ex-militante da esquerda radical,
ex-deputado federal, intelectual e jornalista publicou no jornal O Globo de
domingo, dia 5 de novembro, um artigo muito bem elaborado com o título “No
coração das trevas”. Nele, Gabeira analisa a profundidade da crise de segurança
do Rio, levada as manchetes dos meios de comunicação de todo o país pelas
declarações do ministro da Justiça Torquato Jardim de que a crime ali praticada
estaria sendo sustentada por políticos e por comandantes de batalhões da Polícia
Militar.
Com a reação do governador do estado, do comandante da PM e
dos políticos, o ministro recuou, pediu desculpas, mas quando fez o desabafo,
estava respaldado por informações dos órgãos de segurança do governo federal.
Foi precipitado, reconheceu, mas certamente falava a verdade e o assunto não
vai se encerrar com o recuo. Nem poderia...
O ministro da Defesa, Raul Jungmann, afirmou há algum tempo
que havia relação entre políticos e o crime organizado no Rio. Eles precisam de
voto e o crime organizado controla mais de 800 pontos no Rio de janeiro. Na
Baixada fluminense, esse número é muito maior. Jungmann propôs uma força tarefa
para desvendar os vínculos entre crime e política naquele estado. Raquel Dodge
concordou. Gabeira conta que “não é bem assim” e que, conversando com amigos
dele na PM, estes asseguraram que há bons e honestos comandantes, o que também certamente
é verdade. O perigo maior, sem dúvidas, é a cobertura que esses políticos
influentes dão aos comandantes desonestos e ao crime organizado, impedindo
investigações, punições e a luta total contra esse estado de coisas.
Já escrevi aqui que a decisão do STF acabando com as doações
do setor privado sem colocar nada em seu lugar abriria caminho para que o crime
organizado - que tem dinheiro - financiasse políticos a ele ligados, desestabilizando
o país, como está acontecendo agora no Rio.
O que ocorre é que, como nos conta Gabeira, estabeleceu-se
ali um clima de total desconfiança entre os órgãos de segurança federais e
estaduais, o que impede que o combate ao crime organizado ganhe força e possa
ser eficiente, pois para isso é necessária a completa união e um trabalho em
conjunto das duas esferas governamentais. O que não existe lá.
E o próprio Gabeira que, inclusive, no auge da sua militância,
participou até de sequestros de embaixador, diz com muita propriedade: “O
potencial de descobrir caminhos para programas que reforcem a segurança no Rio
não está em governos combalidos, mas na própria sociedade. Sem que os
sobreviventes no governo peçam socorro e a sociedade lhes dê a mão, não vai
prosperar uma defesa real diante da crise da segurança”. E conclui: “nossas
chances dependem também da percepção do abismo, quanto mais rápida melhor”.
Esse é o retrato do caos a que chegou o Rio. Mas todos
sabemos que é ali e em São Paulo que as facções criminosas, cada vez mais
dominam e se expandem para todo o Brasil. Os métodos são os mesmos e o que
acontece no Rio ecoa por todo o país.
Gabeira está certo. A sociedade tem que participar alertando,
informando. Essa força-tarefa envolvendo os órgãos de segurança federal, estaduais
e o ministério público, é a resposta que deu certo em outros países. São
inúmeros exemplos, na Europa e nos Estados Unidos, até na América do Sul. Nem
tudo está perdido, mas urge começar.
E tem que ser agora!
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