sábado, 1 de março de 2008

Babaçu nos Ares e Territórios da Cidadania II

Reproduzo abaixo artigo do Professor José Lemos:

DUAS BOAS OPORTUNIDADES PARA O MARANHÃO

Uma matéria veiculada no jornal “O Povo” de Fortaleza no último sábado, 23 de fevereiro, deixou-me exultante com mais uma oportunidade que se abre para o Maranhão. Um Estado que desfruta do privilégio de ser dotado de recursos naturais, que dificilmente é superado por outro estado brasileiro. A matéria que o Jornal havia transcrito de jornal do Sudeste tinha o seguinte conteúdo: “Um Boeing 747 da Virgin Atlantic Airlines realizou seu primeiro vôo com biocombustível, visto como uma alternativa mais barata e menos poluente que o querosene, segundo a companhia aérea britânica. A aeronave, sem passageiros, decolou de Londres por volta de meio dia (9:00 de Brasília), com destino a Amsterdã. O combustível é composto por uma mistura de dois tipos de biodiesel, um extraído do BABAÇU (destaque meu) e outro à base de coco”.

O nosso velho babaçu servindo de matéria-prima para um combustível nobre que alimenta turbinas de aviões de última geração. Isso mesmo, aquele coco colhido pelas quebradeiras de coco do Maranhão, do Piauí e de Tocantins principalmente, sendo matéria-prima para movimentar, em elevadíssima velocidade, um mundo carente de alternativas energéticas renováveis e que também não comprometam a produção de alimentos. O mesmo babaçu que ainda pode produzir, através do mesocarpo, uma alimentação altamente saudável, rica em amido, energia e fibras. Babaçu de cuja parte lenhosa do coco, o endocarpo, pode-se produzir carvão com poder calorífico bem acima daquele proveniente do carvão vindo da madeira, com a vantagem de não precisar derrubar árvores para produzi-lo. Babaçu que também do endocarpo pode-se fazer aglomerados para produzir móveis, como demonstra pesquisa realizada aqui na Universidade Federal do Ceará. Por esta pesquisa ficamos sabendo que uma lâmina de aglomerado de endocarpo de babaçu tem a mesma resistência de uma lâmina de igual espessura de compensado feito a partir da maçaranduba, uma das madeiras mais nobres. Ou seja, pode-se fazer móveis com resistência, durabilidade e requinte equivalentes àqueles produzidos a partir da maçaranduba sem derrubar uma árvore sequer.

O que temos que fazer no Maranhão além de preservar e manejar adequadamente as palmeiras de babaçu? Precisamos fazer pesquisas científicas que domestiquem a palmeira, façam seleção de cultivares com elevada produção de amêndoas e encontrem forma mais produtiva de extrair as amêndoas, sem desempregar as quebradeiras de coco. Temos que convencer os agricultores a não utilizarem o fogo para limpeza de áreas, haja vista que o fogo, principalmente se descontrolado, destrói tudo, inclusive as próprias palmeiras de babaçu. Temos que internalizar que esta é uma riqueza que temos e que precisamos utilizá-la de forma sustentável em benefício dos maranhenses.

Outra boa noticia da semana foi o lançamento do programa do Governo Federal “Territórios da Cidadania”, que prevê investimento de R$ 11,6 bilhões em projetos mitigadores de pobreza rural em quase 1000 municípios brasileiros. No Maranhão foram selecionados 55 municípios, mas foi deixada de fora a região do Litoral Ocidental, a segunda mais carente do Estado, e onde está Central do Maranhão, o segundo município do Brasil com menor PIB médio: R$ 1.211,86 por pessoa-ano, segundo o IBGE de 2005. No Governo do Maranhão, que encerrou em dezembro de 2006, foi inaugurada uma experiência, bem sucedida, de programas de mitigação de pobreza, em que, a partir da identificação feita com base científica dos municípios mais carentes, foram implementados projetos estruturantes que eram indicados pelas próprias comunidades a serem beneficiadas, organizadas em associações, legítima e legalmente constituídas. Projetos assim de fato combatem a pobreza. A mera transferência de renda não consegue reduzir exclusão social, como se depreende do caso brasileiro.

A partir dos dados das Pesquisas Nacionais de Amostra por Domicílios (PNAD) do IBGE, a população brasileira que sobrevivia em domicílios cuja renda monetária variava de zero a dois salários mínimos elevou-se de 31,91% em 2001 para 36,04% em 2006. Isto ocorreu devido à “migração” de domicílios das faixas de rendas superiores para aquelas inferiores, o que mostra que esses programas devem ser emergenciais, pois têm apenas “porta de entrada”. O que mitiga exclusão social são ações que incluam as famílias em programas de geração de renda, acesso a água encanada, saneamento, coleta de lixo, redução do analfabetismo, elevação da escolaridade, melhoria das moradias e das vias de escoamento. Pena que o programa tenha sido lançado em ano de eleições. Isto pode abrir brecha para ser rotulado de “eleitoreiro”. Mas a fome e a exclusão social não podem mais esperar e independem de adjetivações. Precisam ser fustigadas, e de imediato. Apenas espera-se que o programa não seja manipulado pelos grupos que sempre se aproveitam dessas ocasiões para incrementarem a própria riqueza.

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José Lemos é Engenheiro Agrônomo. Professor Associado na Universidade Federal do Ceará. lemos@ufc.br.

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