sábado, 22 de maio de 2010

Ricardo e as Ruínas de Alcântara

Confirmadas as informações que dão conta do estrondoso fracasso da operação "retorno à Saúde" anunciada pelo cunhado-deputado Ricardo Murad, estaremos vivenciando no Maranhão do Século XXI uma verdadeira trama, com todos os requintes das velhas cortes, de movimentada comédia do poder.

Muito provavelmente Ricardo Murad se perdeu no caminho de volta. Por pura fanfarronice, dizem uns; por despreparo, proclamam outros. Mais prudente supor verdadeiras as duas teses: o destemido parlamentar misturando, em único cadinho, ignorância e gabolice.

Até onde informam alguns blogues mais antenados, ao perceber fracassadas várias tentativas de manter a Secretaria de Saúde (seus recursos, sobretudo) sob rígido controle, Ricardo Murad partiu para a ofensiva.

Inspirado pela lógica das pombas foi taxativo: mais vale a Saúde na mão do que um mandato voando.

Desincompatibilizado, decidiu recompatibilizar-se. Como? Renunciando à reeleição de deputado estadual para voltar à Secretaria de Saúde; e, assim, tornar-se novamente compatível com a função que sua natureza melhor se coaduna: o trato dos recursos públicos.

Teria reunido, no fim-de-semana, em torno da piscina e de iguarias árabes, seus mais próximos assessores tão somente para anunciar sua decisão: sábia e solitária. Tão sábia quanto solitária.

-Volto na segunda, 17, para a Secretaria. Fulano, manda avisar aí prá imprensa que segunda acabo com esse escarcéu e reassumo a Saúde.

Ainda em sua residência, na manhã de segunda, recebeu um telefonema providencial.

- Deputado! Secretário, o seeeeenhor já conversou com a governadora?

- Oh, rapaz foi bom você me lembrar. Tinha me esquecido. É tenho que passar lá pra avisar... É verdade. Ok, ok até mais tarde.

( Horas depois...)

- Mas como? Como eu vou ficar? Isto não é possível !!! Não! Não!

Neste momento crucial descobriu, amargamente, ser verdadeira a máxima do velho caudilho Leonel de Moura Brizola: cunhado não é parente!

O fato é que na segunda, nada; na terça, muito menos. Na quarta tampouco. Na quinta, sem novidades. Fez até lembrar os versos de Patativa do Assaré, em Triste Partida:

" Setembro passou/ com outubro e novembro/

Já estamos em dezembro/ Meu Deus, que é de nós?"

Permanece no cargo o ex-diretor do Hospital Geral, o médico Luis Alfredo Netto Guterres Soares nomeado Secretário de Saúde à revelia de Ricardo Murad.

Murad resolveu desafiar seu sucessor. Tentou, através de colaboradores remanescentes, manter o órgão sob suas rédeas. Nessa empreitada não teria sequer contado com a colaboração do Secretário Adjunto nomeado em sua gestão, Fernando Neves da Costa e Silva. Profissional e empresário bem sucedido, Fernando Neves optou por pedir demissão do cargo. Melhor que sair que ficar em uma cana-de-braço, uma lengalenga sem fim.

Foi a primeira vitória de Netto Guterres. A disputa parece continuar. Ricardo Murad, pelo visto, desconhece muita coisa da história maranhense. Das relações de poder, de famílias e de compadrios. Muitas delas seculares.

Rossini Correa, em sua "Formação Social do Maranhão: o presente de uma arqueologia" faz referência a duas correntes migratórias, no Maranhão pós-abolição da escravatura. Uma, de senhores e escravos, a caminho de São Luis. Outra, "exclusiva de antigos senhores, de transferirem família e investimentos, com prioridade para o Rio de Janeiro".

Os Nettos Guterres, senhores de Alcântara, deixaram seus casarões portentosos e rumaram, majoritariamente, para São Luis. Entre eles, um certo Luis Alfredo Netto, Guterres um dos mais prestigiados médicos maranhenses da primeira metade do século XX.

Como todas as famílias de grandes proprietários que permaneceram Capital da antiga província, permaneceram influentes nas mais fortes instituições do Estado. O judiciário, por exemplo.

Se tivesse freqüentado (e não abandonado) seu curso de Direito, o deputado-cunhado Ricardo Murad teria pelo menos ouvido falar em Jorge Miranda (Ele vai já pensar que é algum parente do Des. Jamil). E jamais iria esquecer que, sociologicamente no Maranhão, cunhado é parentela, corruptela de parente. Parente é filha, marido da filha, tio da filha, padrinho do marido da filha...

Por estas e por outras, o deputados Ricardo Murad acabou se perdendo pelos de velhos casarões, pelas majestosas e influentes ruínas de Alcântara.

Haroldo Saboia, economista, advogado, Constituinte de 1988, escreve para o Jornal Pequeno todas as sextas-feiras. E-mail: haroldosaboia@hotmail.com


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