quarta-feira, 19 de agosto de 2009

Teatro do Senado mostra do que é feito um senador

A pesquisa Datafolha veiculada no último final de semana gritara para o Senado: Há uma fome de limpeza no ar.


Nada menos que 74% dos brasileiros defendem o afastamento de José Sarney –por renúncia (38%) ou licença (36%).

Descobriu-se que, na opinião de 66% dos patrícios, Sarney está envolvido nos malfeitos que o noticiário acomoda sob seu bigode.

Nesta quarta (19), nas pegadas do ronco do asfalto, o Conselho de (a)Ética reúne-se para decidir o que fazer com Sarney.

Não é uma decisão banal. Os senadores dirão ao país de que matéria-prima eles são feitos. O palco foi armado para o arquivamento.

Respirava-se na noite passada uma atmosfera de jogo jogado.

Ensaiava-se a manutenção na gaveta de 12 ações –11 contra Sarney e uma contra Arthur Virgílio.

Na época das Diretas-Já, o brasileiro bradava por liberdade.

Refeita a democracia, imaginou-se que o voto resolveria tudo. Não resolveu.

A reincidência dos escândalos, um se sucedendo ao outro, expôs a cara de um monstro medonho: a impunidade.

Mais recentemente, o país animara-se com o STF.

Ao arrastar 40 mensaleiros para o banco dos réus, o Supremo parecia informar aos políticos que tentaria fazer da cleptocracia brasileira uma democracia real.

Sobreveio novo desalento. O processo se arrasta. Estima-se que não será julgado antes de 2011. Flerta-se com a prescrição.

Agora, Sarney. Não é um transgressor original. Apenas mimetiza, com variações, depravações já cometidas.

Assemelha-se a Renan ‘Bois Voadores’ Calheiros e a Jader ‘Sudam’ Barbalho. Evoca a imagem de Antônio Carlos ‘Fraude no Painel’ Magalhães.

Há uma diferença, contudo. Jader, ACM e Renan optaram por poupar os colegas do enfrentamento da tragédia. Renunciaram à presidência e/ou aos mandatos.

Com Sarney é diferente. Ele prefere levar o delírio às suas últimas conseqüências. A renúncia, no seu caso, é carta fora do baralho.

Deve-se louvar a teimosia de Sarney. Graças a ela, o país está na bica atestar uma suspeita latente.

Confirmando-se a pantomima do arquivamento coletivo, os senadores informarão à nação que eles são feitos de insensatez.

O Senado, ficará demonstrado, é feito de uma maçaroca em que se misturam a conivência e o compadrio. Não há culpados no prédio. Só inocentes e cúmplices.

No fundo do poço, o Senado decidiu continuar cavando. Lula, salva-vidas de Sarney, festeja a opção pela cova.

Enquanto fornece enxadas à bancada do PT, Lula ilude a malta com discursos pseudomoralizadores.

Discursos como o que pronunciou nesta terça (18), num pa©mício realizado no Rio. Disse que seu governo está mudando a forma de “fazer política” (assista lá no rodapé).

Lula perguntou à platéia: “Vocês sabem por que tem tanta coisa de corrupção na televisão e nos jornais?”

Respondeu: “É porque a corrupção só aparece nos jornais quando você está investigando”.

Louve-se a esperteza de Lula. Graças a ela, o país dá de cara com a política real de um Brasil gelatinoso.

Um país feito de inércia, de bigodes viscosos, da grandeza da vista curta, da sofreguidão dos interesses mesquinhos.

Com a ajuda de Lula, o Senado ganha a forma de um estômago gigantesco. É feito de tripas que engolem e digerem a paciência da platéia, saboreando o eterno poder sem propósito.

Até bem pouco, o Senado era o império do privado disfarçado de interesse público. Agora, sonega-se à bugrada até a delicadeza da dissimulação.

Os senadores já não se preocupam em maneirar.

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